Robert Aldrich era um grande realizador virado para um cinema macho e viril.
Deu boas cartas em diversos géneros.
Ei-lo no Western.
Com duas grandes movie stars. Bem machos e em viril confronto, é claro.
México, 1866.
Um grupo de aventureiros americanos chega ao país, então em revolução, em busca de peripécias e dinheiro fácil.
O Imperador Maximiliano contrata esse grupo para escoltar uma Condessa.
Mas são muitos os intere$$es.
É Western puro tratado com um puro actioner (não faltam peripécias e acção).
Menos duelo de bons contra maus, é mais um conto sobre a ganância e a forma como tal tolda e destrói amizades e lealdades (se é que ambas existem).
Já se pode ver aqui alguma desconstrução de alguns arquétipos do western (neste filme não há good guys, há apenas maus, vigaristas e menos maus, ou alguém que se move numa área de moralidade cinzenta).
E é um filme onde a traição domina, sendo todos traídos.
O que torna (ainda mais) o filme viciante, é a sucessão de surpresas e reviravoltas movidas pelas traições constantes e troca de lealdade$.
Não há amizades puras nem alianças estáveis, apenas os intere$$es de cada um.
Em certa medida, “Vera Cruz” já parece antecipar a renovação que Sam Peckinpah daria ao género, bem como a corrente estética e narrativa do Western-Spaghetti (violência forte, elevado body count, personagens dúbios e quase todos do lado do mal, muita manipulação de lealdades e amizades, traições).
Há luxo na produção (filmagens no México, a cena do baile, a quantidade dos figurantes).
Há boas doses de action (os ataques, as perseguições), que já antecipam muito do que o género Actioner daria nos 70s e 80s.
Excelente fotografia.
Robert Aldrich sabia (e sempre soube) fazer Cinema duro, adulto e viril. Em quase todos os géneros – suspense (“Whatever Happened to Baby Jane” é uma referência), film noir (“Kiss Me Deadly” é uma referência), guerra (“The Dirty Dozen” é o seu filme mais popular e é uma referência).
No Western o cineasta também se afirmou e “Vera Cruz” é um dos seus melhores filmes, um dos seus melhores trabalhos e é (também) uma referência.
Aldrich sabe carregar na acção, na violência, no tom dúbio da moralidade, da tensão entre todos os envolvidos, dar espectáculo e fazer (grande) Cinema.
O elenco transporta muitos bons nomes e todos se comportam à altura.
Mas tendo-se como protagonistas duas living legends do Cinema, é claro que a atenção se debruça sobre eles.
Gary Cooper já tratava o Western por Tu desde os 30s. E ei-lo, já bem veterano, sempre tranquilo no seu heroísmo.
Burt Lancaster estava em (boa) afirmação e usa todo o seu carisma másculo para criar um personagem perigoso, evitável, truculento e fascinante. E é sempre divertido ver Burt (ainda que como mauzão) a mostrar a sua radiante dentadura. E dá ao seu personagem um visual que parece derivado dos comics e já antecipa o look dos (anti-)heróis do western-spaghetti.
É grande coboiada, é grande filme de acção, é grande Cinema assinado por um dos seus mestres, apoiado em duas das maiores movie stars de sempre, que foi bem inovador e ainda é referencial.
“Vera Cruz” não tem edição portuguesa.
Existe noutros mercados, a bom preço.
Realizador: Robert Aldrich
Argumentistas: Roland Kibbee, James R. Webb, Borden Chase
Elenco: Gary Cooper, Burt Lancaster, Denise Darcel, Cesar Romero, Sara Montiel (como Sarita Montiel), George Macready, Jack Elam, Ernest Borgnine, Charles Bronson (como Charles Buchinski)
Trailer
Clips
A música
John Landis sobre o filme
Orçamento – 1.6 milhões de Dólares
Bilheteira – 11 milhões de Dólares; 4.5 milhões de espectadores (França)
Borden Chase criou o argumento com John Wayne em mente como protagonista.
Burt Lancaster e Harold Hecht tinham assinado contrato com a United Artists, para dois filmes. O primeiro tinha sido “Apache” (1953), também realizado por Robert Aldrich.
A United Artists ficou tão contente com “Apache”, que logo mudou o contrato para sete filmes.
Clark Gable aconselhou Gary Cooper a não contracenar com Burt Lancaster. Segundo Gable, Lancaster iria eclipsar Cooper com a sua forma de interpretar.
Curiosamente, Gable e Lancaster trabalhariam juntos em “Run Silent, Run Deep” (1958, de Robert Wise).
Segundo Mamie Van Doren, Burt Lancaster entrevistou-a no sentido de ela interpretar a Condessa, e tentou seduzi-la. Van Doren rejeitou tal iniciativa. Lancaster pediu desculpas. A actriz ainda fez uma audition.
Mari Blanchard era a eleita, mas nada avançou. Denise Darcel foi então escolhida.
Robert Aldrich e Burt Lancaster reencontram-se-depois de “Apache” (1954). Voltariam a trabalhar juntos em “Twilight`s Last Gleaming” (1977, um dos últimos filmes do cineasta).
Robert Aldrich e Charles Bronson reencontram-se depois de “Apache”. Voltariam a trabalhar juntos em “The Dirty Dozen” (1967, onde se reencontram com Ernest Borgnine).
Robert Aldrich e Ernest Borgnine reencontrar-se-iam em “The Dirty Dozen” e “Emperor of the North” (1973). Ambos os filmes contavam também com Lee Marvin.
George Macready tinha 54 anos e interpreta o Imperador Maximiliano. Quando Maximiliano morreu, tinha 34 anos.
É o último filme onde Charles Bronson aparece creditado como Charles Buchinsky (o seu nome verdadeiro).
Gary Cooper não ficou muito contente com algumas decisões criativas no argumento sobre o seu personagem. Segundo Cooper, seria mais lógico que o seu personagem (um Confederado, na Guerra Civil Americana) ficasse aliado do Imperador. Na verdade, o Imperador Maximiliano chegou a recrutar muitos Confederados.
Segundo Burt Lancaster, Gary Cooper estava sempre a pedir alterações no argumento, no sentido de ter o seu personagem a fazer o que era correcto.
Burt Lancaster era produtor, mas não teve problema em que o nome de Gary Cooper surgisse em primeiro lugar.
Filmado no México.
Foi um dos primeiros filmes a ser filmado no México.
A lei mexicana exigia que se usasse um realizador local.
É o primeiro filme em SuperScope Widescreen. Era filmado em 1.37:1 aspect ratio, passado para 2:1, ficando assim compatível para CinemaScope. Era uma forma simples e barata de se conseguir tal.
É o terceiro de quatro filmes que Gary Cooper fez no México.
Segundo Robert Aldrich, havia muita improvisação no set.
Num dia, durante uma pausa, Charles Bronson e Ernest Borgnine foram à cidade mais próxima comprar cigarros. Iam vestidos como no filme e “armados”. Perante o seu visual, as autoridades locais mandaram-nos parar com ameaça de armas.
Gary Cooper aleijou-se numa cena, dada a enorme quantidade de explosivos usada.
Gary Cooper queixou-se de Sara Montiel, que cheirava mal e não lavava o cabelo.
Segundo Ernest Borgnine, Burt Lancaster levou os filhos ao set e eles brincavam com Jack Elam por causa de ele ter um tique no olho. Elam ficou chateado com eles e com Lancaster. Elam e Lancaster ainda chegaram a ter um momento de confrontação física.
Robert Aldrich e Burt Lancaster tinham-se dado bem em “Apache”, mas as coisas não correram bem em “Vera Cruz”. Lancaster já tinha o projecto de enveredar pela realização (seria “The Kentuckian”, feito em 1955), pelo que começou já a querer tomar algumas decisões criativas no filme. Até porque Lancaster era também um dos produtores do filme, através da sua companhia Lancaster-Hecht Productions.
Gary Cooper e Burt Lancaster deram-se bem nas filmagens.
No filme, o trajecto passa pelas Pirâmides do Sol, em Teotihuacán. Mas tal local não fica a caminho de Vera Cruz, tendo em conta o itinerário definido no argumento.
“Vera Cruz” foi um enorme sucesso de bilheteira nos USA e na Europa.
O governo mexicano não gostou do filme, pela forma como os mexicanos são retractados e usados.
Segundo Eli Wallach, o governo mexicano ficou de tal modo chateado pela forma como os mexicanos foram mostrados neste filme, que houve muita interferência deste na forma como os mexicanos eram ilustrados em “The Magnificent Seven” (1960, onde Wallach é o vilão).
Gary Cooper foi considerado como demasiado velho para o seu personagem.
O filme foi inovador na época, pelo recurso à violência (chegam-se a usar crianças como reféns) e pela atitude amoral dos personagens. Acredita-se que tenha sido influente sobre Westerns igualmente desconstrutivos face a alguns arquétipos do género – “The Magnificent Seven” (1960, de John Sturges), “The Professionals” (1966, de Richard Brooks, também com Burt Lancaster), “The Wild Bunch” (1969, de Sam Peckinpah), bem como o Western Spaghetti de Sergio Leone.
Há quem considere “Vera Cruz” como o primeiro Western Spaghetti, pois no filme já se definem alguns arquétipos estéticos e narrativos do género.
Foi um título muito influente sobre Sergio Leone para criar o denominado Western-Spaghetti.
Robert Aldrich queria fazer um filme sobre o Imperador Maximiliano. O projecto não avançou.
É um dos filmes preferidos de Robert Aldrich.
Em 1963, Aldrich anunciou uma sequela, com o título “There Really Was a Gold Mine”. O projecto nunca avançou.