O western sempre foi um género masculino (mas não machista).
Mas em muitos títulos, a mulher nunca tem presença decorativa, inócua, insossa ou como lady in distress, comportando-se mesmo à altura dos pistoleiros protagonistas (vejam-se muitas das coboiadas de Howard Hawks) e sendo pilares emocionais dos heróis (vejam-se muitas das coboiadas de John Ford).
Raro é verem-se títulos do género, completamente protagonizados por mulheres. Mas eles existem.
Há dias pude fazer uma double session onde aproveitei para rever um par de títulos recentes, inseridos precisamente no campo do female western.
Aqui fica o resultado da revisitação.
Bad Girls – Mulheres de Armas (1994)
Nesta altura, Hollywood tentava retomar o western, devido aos sucessos (nas bilheteiras e nos Oscars) de “Dances With Wolves” e “Unforgiven”. Vários foram os títulos surgidos (“Geronimo”, “Wild Bill”, “Tombstone”, “Wyatt Earp”, “Posse”), com os mais diversos resultados (artísticos e financeiros).
Este título marca a diferença por ser centrado em mulheres.
É assinado por Jonathan Kaplan, tarefeiro formado na “Escola Roger Corman” e que tinha ganho alguma reputação em 1989 ao assinar o muito bom “The Accused”, que deu o Oscar a Jodie Foster.
O elenco é excitante – a adorável Madeleine Stowe, a já crescidinha Drew Barrymore, a eterna girl next door Mary Stuart Masterson e a cativante Andie MacDowell.
Numa pequena povoação, quatro prostitutas fazem parceria quando uma delas mata o agressor de outra. A justiceira é presa pelas autoridades e condenada à forca. As outras três libertam-na e iniciam um percurso à margem da lei. Até que se encontram com o antigo gang de uma delas e velhas contas têm de ser saldadas. Por outro lado, uma delas encontra o true love que sempre procurou. O futuro parece promissor para todas. Mas elas só ficarão completamente livres depois de um decisivo duelo ao pôr-do-sol com os seus inimigos.
Um correcto western, que muito vive da presença, talento e carisma das quatro protagonistas, metendo-as em situações habitualmente lidadas por homens.
Claro que Kaplan não é Hawks nem Peckinpah, por isso nem a intensidade da relação sentimental entre as meninas tem a profundidade que merecia, nem a violência com que se confrontam atinge os níveis exigidos.
Fica a capacidade de entretenimento e o empenho das meninas.
Nada desprezável.
Mas se fosse John Carpenter a realizar…
Trailer
Bandidas (2006)
É um produto da “fábrica” de Luc Besson.
A dupla protagonista é verdadeiramente vulcânica – Penélope Cruz e Salma Hayek.
Maria e Sara não podiam ser mais opostas. A primeira é uma mulher do povo, pobre, trabalhadora. A segunda é filha de um poderoso rancheiro. O destino encarrega-se de as juntar e obrigá-las a formar uma dupla (à margem da lei, pois). O objectivo é pilhar o máximo de dinheiro possível (mas só dos mauzões) e usá-lo para bem do México e das populações.
Tem ar de western, mas acaba por ser uma comédia de acção, localizada nos tempos do faroeste.
O ritmo é imparável, as situações são sempre de um simpático humor, a química entre as protagonistas, o carisma e presença atingem níveis absolutamente escaldantes.
Bela fotografia, de muito bom recorte e luminosidade, carregando bem nos tons dourados. Boa música de Eric Serra, um habitual de Besson.
A dupla de realizadores Joachim Rønning e Espen Sandberg vinha da publicidade, dos videoclips e das curtas-metragens e cativaram a atenção de Besson. Fazem um bom trabalho, sabendo dar ao filme um ar entre o clássico e o moderno, conciliando muito bem diversos géneros e até nem se inibem de fazer estilo (o tiroteio em câmara lenta e em plano-sequência, dentro de um vagão).
Um divertido e quente entretenimento.
Site – http://www.bandidas-lefilm.com/
Trailer
Claro que longe de mim está a ideia de defender que “Bad Girls” e/ou “Bandidas”são duas obras magistrais de cinema.
Estamos perante dois agradáveis e competentes entretenimentos, com a vantagem do factor feminino (que nos dois títulos ajuda a consolar o olhinho do espectador) prevalecer num género habitualmente dominado por homens.
Para se ver grandes e magistrais westerns femininos, aí recomendo o incontornável “Johnny Guitar” (1954, de Nicholas Ray, com Joan Crawford), bem como os notáveis “Rancho Notorious” (1952, de Fritz Lang, com Marlene Dietrich) e “40 Guns” (1957, de Samuel Fuller, com Barbara Stanwyck).