O Denunciante (1947)

 

 

Título original – Kiss of Death

 

Um clássico do Film Noir, pleno de drama, que nos revelou Richard Widmark.

E logo com um dos mais tenebrosos e letais vilões do Cinema.

 

Nick Bianco é apanhado depois de um assalto a uma joalharia.

Homem de família, Nick recusa denunciar os seus cúmplices. Mas uma tragédia obriga Nick a mudar de opinião.

Nick aproxima-se do tenebroso Tommy Udo e consegue informações preciosas para a Polícia.

Mas a sua família está em risco.

Melodrama familiar e Film Noir, com algo de Gangster Film, em feliz combinação.

É a história do pequeno criminoso com coração (e família), da firmeza dos seus valores e ideais, confrontado com o dilema entre (não) ser bufo e salvar a família.

É uma história sobre crime e criminosos, mas sobre valores superiores ao da vida à margem da Lei.

É um conto sobre um duelo de mentalidades entre criminosos – Nick cometeu os seus erros, mas sem ser homicida; Tommy não olha a meios para os seus fins.

O drama é pleno de emotividade (afinal, é sobre um pai que quer reencontrar as filhas e retomar uma vida normal com elas; o reencontro entre os três, a despedida na estação de comboio, os momentos românticos entre Nick e Nettie), a trama criminal é plena de meandros (os esquemas do District Attorney em infiltrar Nick, as iniciativas dele, os infortúnios).

É drama, sim, mas o filme nunca esquece que se move no terreno do Noir.

Há bons momentos de suspense (a cena no elevador, com o desejo de fuga e o não parar de entrar mais passageiros, em constantes paragens em todos os pisos, com o nunca mais chegar ao lobby) e de tensão (o confronto de Nick e Tommy no restaurante, onde tanto é subentendido; o acto final de Nick e o que se segue).

E para a História do Cinema, um momento de altíssima violência e brutalidade – o empurrar da senhora na cadeira de rodas, pela escadaria abaixo, por parte de Tommy. Um momento que é um must no género e dessa índole.

Excelente fotografia (os momentos à noite; a iluminação dos rostos, principalmente os de Nick e Tommy em momentos cruciais; o plano de Nick e Nettie na mesa, à noite).

Victor Mature convence como homem íntegro mas abalado, um small time crook que procura uma redenção para os seus erros, mesmo com o risco da vida. É uma das suas melhores interpretações e rivaliza perfeitamente com o seu soberbo trabalho em “My Darling Clementine” (1945).

Richard Widmark estreia-se no Cinema e logo de uma forma fulgurante, ao nível de muitos poucos arranques de carreira cinematográfica. Widmark cria um personagem grotesco, maléfico, brutal, maquiavélico, calculista, cínico, frio, quase demoníaco. E com aquela gargalhada sinistra, que chega a provocar arrepios.

O duelo entre Mature e Widmark é puro desfile de actores, ao seu melhor.

O restante elenco acompanha-os bem, com destaque para o sempre impecável Brian Donlevy e uma delicada Coleen Gray.

Henry Hathaway sempre foi um hábil e versátil realizador, capaz de fazer sempre bem. Algum do seu curriculum tem ligação ao Western, mas antes de tal há muita ligação ao Film Noir. E ei-lo aqui a cumprir muito bem, tanto no registo noir como no lado dramático, nunca caindo em excessos nem manipulações, fazendo bom uso do material escrito, dos actores, dos ambientes e dos meios.

É um dos seus melhores trabalhos.

Um melodrama noir bem emotivo e humano, bem alicerçado no par masculino protagonista, com um vilão inesquecível.

 

“Kiss of Death” não tem edição portuguesa. Existe noutros mercados, a bom preço.

Realizador: Henry Hathaway

Argumentistas: Ben Hecht, Charles Lederer, Eleazar Lipsky, Philip Dunne (sem crédito)

Elenco: Victor Mature, Brian Donlevy, Coleen Gray, Richard Widmark, Taylor Holmes, Howard Smith, Karl Malden, Millard Mitchell

 

Trailer

 

Clips

 

Filme

 

Eddie Muller sobre “Kiss of Death”

 

Orçamento – 1.52 milhões de Dólares

Mercado doméstico – 1.65 milhões de Dólares

 

Richard Widmark esteve nomeado para “Melhor Actor Secundário”, nos Oscars 1948. Perdeu para Edmund Gwenn em “Miracle on 34th Street”. O filme também concorreu a “Melhor Argumento”, mas foi derrotado por “Miracle on 34th Street”.

Richard Widmark foi a “Melhor Promessa – Masculino”, nos Globos de Ouro 1948.

“Melhor Actor” (Victor Mature), “Melhor Argumento”, no Festival de Locarno 1948.

Victor Mature e Richard Widmark foram a “Melhor Interpretaçao do Mês”, nos Photoplay 1947.

O argumento baseia-se numa história de Eleazar Lipsky, um ex district attorney de Manhattan. A 20th Century Fox apanhou a ideia e desenvolveu um projecto cinematográfico.

James Cagney ia ser Nick Bianco, mas depois escolheu-se Victor Mature.

Richard Conte ia interpretar Tommy Udo.

O screen test de Richard Widmark foi de enorme agrado a Darryl F. Zanuck (o #1 da 20th Century Fox), que o chamou imediatamente.

É o primeiro filme de Richard Widmark.

É o primeiro filme em que Coleen Gray vê o seu nome creditado no genérico.

Susan Cabot e Jesse White têm aqui o seu primeiro filme.

 

Houve muita filmagem em Nova Iorque e na prisão de Sing Sing.

Inicialmente, Henry Hathaway não gostou da escolha de Widmark como vilão e quis que ele saísse do filme. Zanuck negou tal e Hathaway tornou o ambiente difícil para Widmark. Mas tudo se resolveu, Hathaway e Widmark entenderam-se, tornaram-se amigos e até voltaram a trabalhar juntos em vários filmes. Widmark seria uma das pessoas que carregaria o caixão de Hathaway no seu funeral.

Segundo Widmark, ele só trabalhou 13 dias.

Henry Hathaway manifestou agrado pelo filme e pelo trabalho de Victor Mature, lamentando apenas que este andasse sempre muito activo de noite e cansado durante o dia (quando se filmava). O realizador chegou a oferecer um par de fatos ao actor.

 

Filmou-se uma cena com a esposa de Nick, Maria (interpretada por Patricia Morison), onde ela era violada e se suicidava. A cena foi cortada da montagem final.

Segundo Widmark, a cena da cadeira de rodas teve de ser filmada duas vezes.

O momento em que Tommy atira uma mulher numa cadeira de rodas pelas escadas abaixo teve de ser cortado no Reino Unido. Só décadas depois é que tal momento foi visto.

O inalador que Tommy Udo usa foi uma ideia de Zanuck.

O personagem de Brian Donlevy tem semelhanças físicas com Thomas E. Dewey, um ex district attorney. Dewey concorreu a Presidente no ano seguinte, mas perdeu.

No final, Tommy Udo está num Lincoln Custom de 1942. Só 113 exemplares foram construídos, com a sua produção a ser interrompida com a entrada dos USA na Segunda Guerra Mundial.

Quem dobra Mildred Dunnock na cena da queda pela escada é Rod Amateau, marido de Coleen Gray.

O final ia ser diferente para Nick, mas depois decidiu-se pelo final como se vê no filme.

Widmark é grande fã de Batman, pelo que se inspirou em The Joker para a sua interpretação. Alguns críticos e espectadores deram conta disso.

Curiosamente, Frank Gorshin, que interpretava The Riddler na série televisava dedicada a Batman, nos 60s, inspirou-se na interpretação de… Widmark.

É a única nomeação aos Oscars de Richard Widmark.

São muitos os que defendem que é neste filme que Victor Mature tem a sua melhor interpretação (de acordo, mas não esqueçamos “My Darling Clementine”, OK?).

 

Apesar da óptima recepção da crítica, o filme não foi um sucesso.

O tempo foi generoso com o filme e este ganhou estatuto de clássico.

 

O Lux Radio Theatre emitiu uma versão radiofónica de 60 minutos, em Janeiro de 1948. Richard Widmark, Victor Mature e Coleen Gray retomaram os seus personagens.

 

O The Screen Guild Theater emitiu uma versão radiofónica de 30 minutos, em Outubro de 1948. Mature, Widmark e Gray retomaram os seus personagens.

(os primeiros 25 minutos)

 

O The Screen Guild Theater voltou a emitir uma versão radiofónica, agora de 60 minutos, em Março de 1951. Só Mature e Widmark regressaram.

 

Os maneirismos de Tommy Udo inspiram um gangster – Joe Gallo, um assassino de Nova Iorque, com a alcunha de “Crazy Joe”. Seria morto em 1972, por rivais.

A performance de Richard Widmark neste filme inspirou o escritor Donald E. Westlake a criar um pseudónimo para escrever romances mais duros, negros e violentos. Richard Stark foi o nome criado e a saga “Parker” (que já deu origem a muitos filmes) foi a mais popular.

 

O filme inspirou um Western em 1958 – “The Fiend Who Walked the West”, de Gordon Douglas, com Hugh O’Brian e Robert Evans.

O filme teve um (muito bom, diga-se) remake em 1995 (já aqui visto). “Kiss of Death”, de Barbet Schroeder, com David Caruso, Nicolas Cage, Samuel L. Jackson e Helen Hunt. O remake é escrito por Richard Price, que já tinha escrito outro remake de outro filme com Richard Widmark, “Night and the City”.

 

One comment on “O Denunciante (1947)

  1. […] of Death” (1947, já aqui visto) já tinha bom estatuto como clássico do […]

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