Título Original – The Quiet Man
É um dos mais bem-amados filmes de John Ford e do Cinema.
E tem boas razões para tal.
E acreditam que pouca gente acreditava nele?
Sean Thornton, ex-pugilista, regressa à Irlanda, a sua terra natal.
No reencontro com a família e antigos amigos, Sean encontra Mary Kate Danaher, uma aguerrida irlandesa que imediatamente agarra o coração de Sean. Mas ela é irmã de “Red” Will Danaher, um irlandês bem irascível.
Sean e Mary Kate preparam a sua vida em conjunto, mas “Red” Will não concorda.
Tudo terá de ser resolvido com os punhos. Mas sem ringue.
É um conto sobre um homem que está cansado de uma vida de luta (nos ringues de boxe) e procura o sossego.
É um conto sobre a paixão intensa entre duas pessoas (bastante) indomáveis.
É um conto sobre beijos (muito) apaixonados e (bem) eróticos.
É uma ode à Irlanda, às suas gentes, aos seus costumes, à sua paisagem, à sua música, à sua cultura.
E pouco importa se “na verdade” a Irlanda e os irlandeses (não) são (mesmo) assim.
É Cinema de John Ford.
Como tal, o que conta é a lenda e não a verdade.
Mas seja qual for o ponto de vista por onde olhemos para este “The Quiet Man” é um filme lindo, encantador e divertido.
Lindo pela palette de cores (belíssima fotografia) que ilustram a gama colorida e esbelta da paisagem irlandesa. Queremos ir já para lá passar umas férias, a reforma ou o resto da vida.
Lindo pela dimensão humana. Como sempre no Cinema de Ford, há uma vasta palette humana, plena de personagens ricos, carismáticos, cheios e relevantes.
Lindo pela dimensão emocional que motiva todos os eventos – afinal tanta discussão e conflito é só por Amor (e as suas diferentes formas).
Encanta a forma como se vê a Irlanda e os irlandeses, a paisagem do país e a forma como os irlandeses se relacionam e vivem a vida.
Diverte ver tanta gente feliz e alegre.
John Ford nunca esteve tão feliz, divertido, humano, romântico e ilustrativo como neste filme.
Certamente que muitos preferem os filmes mais densos, sérios e “negros” (“The Searchers”, “Cheyenne Autumn”, “The Man Who Shot Liberty Valance”), mas este é mesmo um dos momentos máximos do autor de “Stagecoach”.
Elenco de luxo em estado de graça.
Ward Bond é sempre capaz como voz conciliadora.
Barry Fitzgerald é um querido.
Victor McLaglen impressiona como brutamontes de bom coração.
John Wayne não perde a sua virilidade habitual, mas consegue um inesperado registo romântico.
Maureen O`Hara é todo um ciclone irlandês, indomável e sensual. E aqueles cabelos ruivos e aqueles lábios vermelhos…!!! É Maureen que dá ao filme uma sensualidade inesperada e muito agradecida.
Uma maravilha de Cinema (fordiano ou não), resultando num dos mais belos, românticos e eróticos filmes sempre.
“The Quiet Man” tem edição portuguesa, a bom preço. A edição espanhola conta com um novo master e tem legendas em Português. Outros mercados têm edições com cinéfilos extras. Algumas andam a bom preço.
Realizador: John Ford
Argumentistas: Frank S. Nugent, John Ford (sem crédito), a partir do conto de Maurice Walsh (“The Green Rushes”)
Elenco: John Wayne, Maureen O’Hara, Barry Fitzgerald, Ward Bond, Victor McLaglen, Mildred Natwick
Trailer
Clips
O beijo
A cena de luta
Bastidores
Making of
Gabriel Byrne sobre o filme
No TCM
Orçamento – 1.75 milhões de Dólares
Bilheteira – 3.8 milhões de Dólares
Mercado doméstico – 3.2 milhões de Dólares
Esteve nomeado para “Melhor Filme”, nos Oscars 1953. Perdeu para “The Greatest Show on Earth”. Mas ganhou para “Melhor Realizador” e “Melhor Fotografia – Cores”.
“Melhor Realizador”, pelo Directors Guild of America1953.
“Top 10 do Ano”, pela National Board of Review1952.
“Filme a Preservar”, pela National Film Preservation Board2013.
“Prémio Internacional”, em Veneza 1952.
“Melhor Argumento – Comédia”, pelo Writers Guild of America 1953.
John Wayne a receber o Oscar por John Ford
John Ford queria formar uma companhia de produção, com Ronald Colman e Tay Garnett, em 1937. Seria a “Renowned Artists”. Nada avançou devido à falta de financiamento.
O conto de Maurice Walsh, “The Green Rushes”, foi publicado em 1933, no “Saturday Evening Post”.
Ford leu o conto em 1933 e logo comprou os direitos.
Era um projecto antigo e desejado de Ford. Mas nenhuma das majors o queria produzir.
A solução veio pela Republic Pictures, por cortesia com John Wayne (já tinham trabalhado juntos várias vezes).
A Republic aceitar produzir o filme, mas antes Ford, Wayne e Maureen O’Hara têm de fazer um western para o estúdio. Foi “Rio Grande” (1950) e foi um sucesso. O estúdio contava que “The Quiet Man” fosse um flop e queria um sucesso comercial para compensar.
É a primeira produção da Republic feita fora dos USA.
O filme marcou uma mudança na Republic Pictures, produtora especializada em westerns, comédias e filmes de guerra, todos de Série B, bem como no tipo de filmes que John Wayne & John Ford faziam (westerns).
Mais um encontro entre John Wayne & John Ford – “Stagecoach” (1939), “The Long Voyage” (1940), “They Were Expendable” (1945), “Fort Apache” (1948), “3 Godfathers” (1948), “She Wore a Yellow Ribbon” (1949), “Rio Grande” (1950), “The Quiet Man” (1952), “The Searchers” (1956), “The Wings of Eagles” (1957), “The Horse Soldiers” (1959), “The Man Who Shot Liberty Valance” (1962), “How the West Was Won” (1962) e “Donovan`s Reef” (1963).
É o segundo filme (de cinco) que reúne John Wayne & Maureen O’Hara – “Rio Grande” (1950), “The Quiet Man” (1952), “The Wings of Eagles” (1957), “McLintock” (1963), “Big Jake” (1971).
Maureen O’Hara trabalha com os seus dois irmãos, Charles Fitzsimons e James Fitzsimons (que é mencionado como James Lilburn).
O líder da Republic, Herbert J. Yates, queria que o filme tivesse o título “The Prizefighter and the Colleen”. Ford discordou.
Yates queria que Ford usasse o tipo de película do estúdio (TrueColour), mas o cineasta preferiu usar Technicolor (que era mais caro, mas de melhor qualidade).
Segundo O’Hara as filmagens precisaram de 6 semanas nos exteriores da Irlanda, com todos os interiores a serem filmados em estúdio, em Los Angeles.
O director de fotografia viu-se com dificuldades. Apesar de alguns belos dias de sol, frequentemente o céu estava nublado e chuvia. Isto obrigou a muito trabalho em termos de iluminação.
Ford quis que o filme apresentasse a sua visão da Irlanda e dos irlandeses.
A crew e o set tinham ambiente de família – a filha de Ford assitia o editor do filme, ela e o seu marido participam numa cena, o filho de Ford é um dos second unit directors, Ford trouxe um padre amigo seu em Hollywood para servir de conselheiro e abençoar as filmagens, o irmão de Ford também participa nalgumas cenas, o filho de McLaglen (Andrew V. McLaglen – que se tornaria realizador de muitos westerns com John Wayne) é um dos assistant director, Wayne trouxe os seus quatro filhos e surgem na cena da corrida (estão na carroça com Maureen O’Hara).
John Wayne foi um dos second unit directors (tendo assim a sua primeira experiência na realização – para “Alamo”, o seu primeiro filme como realizador, teve boa ajuda de Ford nessa função).
Barry Fitzgerald interpreta um padre católico. Arthur Shields interpreta um padre protestante. Barry e Arthur eram irmãos e já tinham trabalhado juntos sobre as ordens de Ford, em “The Long Voyage Home” (1940). Os dois irmãos eram protestantes.
O irmão de O’Hara, Charles B. Fitzsimons, interpreta um dos membros do IRA.
Muitos dos actores presentes são do Dublin’s Abbey Players, onde Maureen O’Hara e Barry Fitzgerald começaram as suas carreiras. Alguns deles aparecem noutro filme de Ford, “The Plough and the Stars” (1936).
Os habitantes da cidade de Cong (onde se filmou) estavam entusiasmados pelas filmagens. Alguns deles tiveram trabalho no filme.
A cena na capela, com a agua benta, decorre numa capela católica, mas a capela era na verdade protestante. O Clero Católico local não gostou que se usasse uma capela protestante, o Clero Protestante não queria que se usasse uma capela protestante para um “ritual” católico. Decidiu-se fazer uma fonte no exterior da capela e todos ficaram satisfeitos. Há informações que Ford estava chateado com a situação e ameaçou que ou as duas partes se entendiam ou as filmagens mudavam-se para os USA.
Wayne e Ford decidiram pregar uma partida a O’Hara. Foi na cena onde ela é arrastada pelo campo, por Wayne. Wayne e Ford colocaram o máximo de ovelhas no caminho onde O’Hara seria arrastada. A actriz viu tal e depois retirou as ovelhas. Mas o actor e o cineasta voltaram a colocá-las no terreno. Feita a cena (onde O`Hara ficou suja de tanto ser arrastada), Ford negou-se a permitir que a actriz se limpasse.
O’Hara não quis usar uma dupla na cena em que é arrastada pelo campo por Wayne.
Victor McLaglen tinha 64 anos e já tinha problemas de saúde. Ford duvidava que o actor (que fora boxeur) conseguisse aguentar a cena de luta com Wayne. O cineasta provocou o actor de tal forma, que este preparou-se devidamente e mostrou-o a Ford.
A cena da luta entre Wayne e McLaglen exigiu grandes cuidados e preparação.
Quando John Ford apresentou o seu final cut, o filme tinha 129 minutos de duração. O estúdio pediu 120. Ford disse que já nada mais podia retirar. Ford retirou então 9 minutos. Quando houve um novo screening, o filme acaba quando começa o confronto entre Sean e Red. O estúdio voltou atrás na decisão e ninguém reclamou.
Quase todos os planos mostram algo em verde, a cor natural da Irlanda.
Sean tem o nome vindo de John Ford – Sean é o seu primeiro nome.
Mary Kate tem o nome vindo de duas mulheres que Ford amava – Mary (a esposa) e Kate (Katharine Hepburn).
O Cohan’s Pub do filme era uma mercearia na realidade. Depois do filme, tornou-se uma loja de souvenirs. Há vários anos que é um irish pub. É gerido por Tara MacGowran, filha de Jack MacGowran (que interpreta Ignatius Feeney).
O’Hara canta.
Na cena em que Sean encontra Mary Kate na cabana, soprava tanto vento, que O’Hara mal conseguia abrir os olhos. Ford berrou-lhe de tal forma, que ela menteve-os abertos.
Na cena do beijo, O´Hara esbofeteia Wayne. Quando este a trava, O`Hara deslocou um osso do pulso. Devido ao facto do filme ser filmado em continuidade, a actriz não pode usar um curativo quando em cena.
Cameo de R.G. Armstrong – o homem que sopra a corneta na corrida. Armstrong já tinha aparecido em “King Kong” (1933), produzido por Ford.
Filmaram-se algumas cenas que ficaram de fora do final cut:
- No início do filme, Sean está no comboio, conversa com uma mãe e oferece uma maçã ao filho dela.
- Mary a falar em Gaélico com Sean, quando se encontram.
- O Padre Lonergan e Michaleen a discutirem sobre apostas em corridas de cavalos.
Na cena de luta, quando o personagem de McLaglen cai ao rio, o actor é dobrado por Patrick Ford, filho de John.
No final, alguém diz “May their days be long and full of happiness. May their children be many and full of health. And may they live in peace and national freedom“. A Republic Pictures mandou cortar a parte “…national freedom”, por achar que tal seria algo controverso na Irlanda.
No final, Maureen O’Hara diz algo a John Wayne que o deixa perplexo. O que foi dito, só O`Hara, Wayne e Ford sabem. Mas sabe-se que Ford pediu a O`Hara para dizer algo que chocasse Wayne. Assim aconteceu.
Os receios sobre a capacidade popular do filme eram inúteis – não só saiu grande filme, como também um enorme sucesso nas bilheteiras e na crítica, embrulhado por Oscars.
Foi o primeiro filme da Republic Pictures a ser nomeado para Oscars e a ganhar.
Foi o primeiro e único filme da Republic Pictures a receber uma nomeação para os Oscars na categoria de “Melhor Filme”.
Fez parte da selecção official do Festival de Veneza 1952.
Maureen O’Hara tinha 31 anos e Victor McLaglen tinha 65. Como tal, muitos acharam que ele deveria ser o pai dela e não o irmão.
Houve quem criticasse o filme por mostrar um lado idealista, fantasista e nada real da Irlanda.
John Wayne ficou algo decepcionado com os sets exteriores.
John Wayne considera que Sean Thornton é um dos seus melhores personagens e interpretações, mas também uma das suas mais difíceis.
É o filme preferido de Maureen O’Hara.
Há uma replica da casa de Wayne em Maam Cross, County Galway, no Oeste da Irlanda.
Cong é hoje uma pequena e dinâmica povoação. Tem um castelo que é um hotel de 5 estrelas, tem um pub local (no local que foi o set do pub do filme) que exibe frequentemente “The Quiet Man”, tem o seu “The Quiet Man Fan Club”.
O beijo entre John Wayne e Maureen O`Hara foi mostrado em “E.T.” (1982) e usado dentro da narrativa do filme.
“The Quiet Man” inspirou o musical da Broadway “Donnybrook!”, feito em 1961.
Em 2010 fez-se o documentário “Dreaming The Quiet Man”, narrado por Gabriel Byrne, com entrevistas e comentários de Peter Bogdanovich, Martin Scorsese, Charles F. Fitzsimons e Maureen O’Hara.
Ainda hoje não se sabe o que O`Hara disse a Wayne no final do filme.