O Talentoso Mr. Ripley (1999)

 

 

Título original – The Talented Mr. Ripley

 

O clássico literário de Patricia Highsmith já tinha inspirado uma excelente adaptação cinematográfica (“Plein Soleil”, em 1960, de René Clément, com Alain Delon; já aqui visto).

Eis uma nova versão, em Inglês, com um excelente elenco.

 

Anos 50.

Tom Ripley procura um jovem milionário, Dickie Greenleaf. Tom fica fascinado por Dickie e pelo seu estilo de vida, bem como pela noiva de Dickie, Marge.

Para Tom tudo vale para manter aquele estilo de vida. Até o crime.

Sofisticado thriller psicológico sobre o tema do duplo, ilustrando todo o jogo bem urdido de uma mente brilhante para o mal.

Tom Ripley fascina e inquieta, mostrando-se um personagem complexo pelas motivações, acções e emoções.

Seguindo a boa regra de Hitchcock (que também abordou o tema do duplo, a partir de Patricia Highsmith – “Strangers on a Train”), é um filme que fica melhor quando “pior” fica o vilão.

Repudiamos Tom, mas não deixamos de nos sentir fascinados por ele, de querermos ver como ele se vai salvar, de qual vai ser o novo esquema dele, e quase que o invejamos.

Inteligentemente, há uma forte carga homoerótica (Tom parece desejar Dickie) e de subtil homofobia (a momento Tom parece repudiar o seu desejo por Dickie e procura colmatar tal com Marge).

A par de todo este carregado drama psicológico sobre um homem, bem como o seu poder em criar verdades e manipular todos dentro delas, o filme não perde a sua dimensão de thriller criminal (há tensão entre Tom e Dickie e percebemos que algo vai explodir, os assassinatos são violentos, a expectativa do encontro no café).

Mas a história é afinal, sobre um homem que só quer um “lugar ao sol”, mudar de vida, ser mais bem-sucedido, ser rico, amar e ser amado.

Belo uso da paisagem italiana, que se torna uma personagem extra.

Excelente score de Gabriel Yared

Bom conjunto de temas de jazz de grandes nomes do género.

Radiante fotografia (do grande John Seale).

Anthony Minghella cria uma atmosfera de filme à moda antiga, adulto, para e com adultos, conseguindo um look bem sofisticado, nunca descurando os personagens e os ambientes, mas sabendo dar um ritmo calmo e sempre envolvente.

Bons nomes no elenco, com todos em magnífico registo.

Matt Damon surpreende pela forma como cria um personagem que parece simpático, tosco ou mesmo sonso, tornando-se inquietante precisamente pela maldade engenhosa que revela. É muito provavelmente o seu melhor trabalho como actor. E aguenta todo o filme impecavelmente, pois está em todas as cenas.

A excelente literatura de Patricia Highsmith origina grande Cinema.

“The Talented Mr. Ripley” não é um remake de “Plein Soleil”. Mas ao vermos o filme com Matt Damon é impossível não pensarmos no clássico com Alain Delon. As qualidades são imensas, mas vamos ver pela comparação:

  • O argumento do filme de 1960 é mais conciso, mas focado no essencial (já se deixa estabelecido que Tom e Dickie são grandes amigos); a versão de 1999 desenvolve mais eventos (como Tom chega a Dickie, o desenvolvimento da relação).
  • A versão com Alain Delon é puramente heterossexual (Tom deseja Marge desde que a conhece), a versão com Matt Damon carrega mais na componente gay (Tom assume-se abertamente com Dickie e …).
  • Ambos são rigorosas ilustrações do talento de uma mente brilhante e maléfica.
  • Há uma prestação impecável do elenco nas duas versões. O elenco secundário da versão de 1999 tem um trabalho superior ao equivalente na versão de 1960. Matt Damon tem uma interpretação que impressiona. Mas Alain Delon fascina, perturba, assusta e seduz, numa interpretação absolutamente perfeita, meticulosamente dirigida e num admirável exercício de contenção (a sua constante calma, a pouca exposição emocional).
  • São dois filmes lindos, com a versão de René Clément a ser mais sofisticada e estilizada (acrescido que se passa na época em que foi filmado), com a versão de Anthony Minghella a ser elegante e a fazer um exercício de revivalismo do tom sofisticado de uma época (anterior à em que o filme é filmado).

 

É uma escolha difícil, e o espectador deve-se sentir agradecido por ter recebido duas notáveis obras de Cinema.

Mas como “Plein Soleil” veio primeiro que “The Talented Mr. Ripley”, faz uma brilhante adaptação do romance de Patricia Highsmith, é de grande nível visual e tem um insuperável Alain Delon (embora Matt Damon impressione, tendo um elenco ao seu lado que até supera o que Delon tem), escolho como vencedor “Plein Soleil”.

Mas “The Talented Mr. Ripley” dá boa luta e vale muito a pena.

 

“The Talented Mr. Ripley” tem edição portuguesa, a bom preço.

Realizador: Anthony Minghella

Argumentista: Anthony Minghella, a partir do romance de Patricia Highsmith (“The Talented Mr. Ripley”)

Elenco: Matt Damon, Gwyneth Paltrow, Jude Law, Cate Blanchett, Philip Seymour Hoffman, Jack Davenport, James Rebhorn, Sergio Rubini, Philip Baker Hall, Celia Weston

 

Site – https://www.miramax.com/movie/the-talented-mr-ripley/

 

Trailer

 

Clips

 

Orçamento – 40 milhões de Dólares

Bilheteira – 81 milhões de Dólares (USA); 128 (mundial)

 

Nomeações nos Globos de Ouro 2000 – “Melhor Filme – Drama” (perdeu para “American Beauty”), “Melhor Realizador” (Anthony Minghella perdeu para Sam Mendes em “American Beauty”), “Melhor Actor – Drama” (Matt Damon perdeu para Denzel Washington em “The Hurricane”) e “Melhor Actor Secundário” (Jude Law perdeu para Tom Cruise em “Magnolia”).

Nomeações nos Oscars 2000 – “Melhor Actor Secundário” (Jude Law perdeu para Michael Caine em “The Cider House Rules”) e “Melhor Argumento Adaptado” (“The Cider House Rules” foi vencedor).

Jude Law foi o “Melhor Actor Secundário” nos BAFTA 2000. O filme ainda concorreu a “Melhor Filme” (perdeu para “American Beauty”) e “Melhor Argumento Adaptado” (perdeu para “The End of the Affair”).

Nomeado para “Melhor Thriller”, nos Saturn 2000. Perdeu para “The Green Mile”.

“Actor Favorito – Suspense” (Jude Law), nos Blockbuster Entertainment 2000.

“Melhor Música”, nos Broadcast Film Critics Association 2000.

Nomeado para “Melhor Filme”, nos Edgar Allan Poe 2000. Perdeu para “Lock, Stock and Two Smoking Barrels”.

Matt Damon foi nomeado para “Melhor Vilão”, nos MTV Movie+TV 2000. Perdeu para Mike Myers em “Austin Powers: The Spy Who Shagged Me”.

“Melhor Realizador”, pela National Board of Review 1999.

“Melhor Argumento Adaptado”, nos Online Film & Television Association 2000.

“Melhor Actor Secundário” (Jude Law) e “Melhor Argumento Adaptado”, pelos críticos de Santa Fe 2000.

Nomeado para “Melhor Argumento Adaptado”, pelo Writers Guild of America 2000. Perdeu para “Election”.

Tom Ripley é criado em 1955 e surge em cinco romances de Patricia Highsmith – “The Talented Mr. Ripley”, “Ripley Under Ground”, “Ripley’s Game”, “The Boy Who Followed Ripley”, “Ripley Under Water”.

 

O romance de Patrcia Highsmith foi adaptado 1956, como um telefilme de uma hora para a série “Studio One”, realizado por Franklin J. Schaffner, com Keefe Braselle, William Redfield, Patricia Smith e Vaughn Taylor. Não há um master restante.

A versão mais famosa foi feita em 1960 por René Clément, com Alain Delon, Maurice Ronet e Marie Laforêt, com o título “Plein Soleil”.

O filme de Claude Chabrol, “Les Biches (1968) inspira-se em algo do romance de Highsmith (o cineasta é grande fã da escritora e já a adaptou várias vezes).

 

Anthony Minghella vinha de “The English Patient” (que fora um sucesso comercial, crítico e nos Oscars 1997), pelo que o seu nome estava bem visto no meio e na Miramax (que produziu “The English Patient” e “The Talented Mr. Ripley”).

Produção conjunta da Paramount e da Miramax. Na época, esta última era propriedade da Disney. Com a passagem do tempo, a Miramax andou por várias mãos, até ver uma parte nas mãos da Paramount.

Sydney Pollack é produtor do filme. Uma função que o realizador teve activa no final dos 80s e ao longo dos 90s – “The Fabulous Baker Boys” (1989, de Steven Kloves), “Dead Again” (1991, de Kenneth Branagh), “Flesh & Bone” (1993, de Steven Kloves), “Sense and Sensibility” (1996, de Ang Lee).

Minghella nunca quis que o seu filme fosse visto como um remake de “Plein Soleil”, mas como uma nova adaptação do romance de Patricia Highsmith.

 

Leonardo DiCaprio, Christian Bale, Tom Cruise e Edward Norton foram considerados como Tom Ripley.

Chegou-se a falar que Leonardo DiCaprio recusou ser o protagonista.

Minghella queria Tom Cruise como protagonista, mas mudou de ideias ao ver Matt Damon em “Good Will Hunting” (1997, co-escrito por Damon em parceria com Ben Affleck, que valeu um Oscar a Robin Williams, bem como a Damon e Affleck).

Minghella viu Jude Law em “The Wisdom of Crocodiles” (produzido pela esposa de Minghella) e ficou muito bem impressionado com ele.

Jude Law inicialmente recusou participar no filme.

Ao saber que Cate Blanchett estava interessada numa personagem, Minghella expandiu a relevância e tempo de presença da mesma.

Minghella fez alterações ao argumento, de forma a dar mais cenas a Blanchett.

John Malkovich esteve prestes a obter os direitos e a realizar o filme. Malkovich seria Tom Ripley em “Ripley`s Game” (2002, de Liliana Calvani).

Filmagens em Nova Iorque e em Itália (Positano, Ischia, Procida, Anzio, Roma e Veneza).

Damon emagreceu e aprendeu a tocar piano

Law ganhou peso, aprendeu a tocar saxofone e foi para Ischia aprender a navegar num iate.

Law partiu uma costela na cena do barco.

Reencontro entre Anthony Minghella e Gabriel Yared, depois de “The English Patient”.

Depois de “Gattaca” (1997), Jude Law volta a interpretar um personagem que vê a sua identidade a ser roubada por outro.

Matt Damon, Jude Law e Gwyneth Paltrow reencontrar-se-iam em “Contagion” (2011).

Primeira de três parcerias entre Anthony Minghella e Jude Law. Seguir-se-iam “Cold Mountain” (2003) e “Breaking and Entering” (2006).

 

No genérico vêem-se outros adjectivos a Ripley, antes de “talented” –mysterious, yearning, secretive, sad, lonely, troubled, confused, loving, musical, gifted, intelligent, beautiful, tender, sensitive, haunted, passionate.

Nos livros, Tom Ripley tem medo de água.

Damon canta no momento em que Ripley canta “My Funny Valentine”.

O perfume que Ripley oferece a Marge é da marca Santa Maria Novella.

No livro, Dickie Greenleaf é descrito como uma “combinação entre Paul Gauguin e Errol Flynn”. Jude Law (que interpreta Dickie) interpretou Errol Flynn em “The Aviator” (2004).

O alfaiate favorio de Dickie é Battistoni, em Roma. Tal alfaiate existe, foi fundado em 1946 e fica em Roma, na Via Condotti, 61.

“Desfile” de “rodinhas” relevantes dos 50s – o Rolls-Royce Silver Wraith 1956 de Herbert Greenleaf, a scooter Lambretta C 1952 de Tom Ripley, a scooter Piaggio Vespa 1950 de Dickie Greenleaf, o Alfa Romeo Giulietta Spider 1955 de Freddie Miles.

O filme foi um sucesso de público e crítica. Inevitavelmente, alguma crítica comparou “The Talented Mr. Ripley” com “Plein Soleil” e, como é óbvio considerou o clássico francês melhor.

Florian Henckel von Donnersmarck considerou “The Talented Mr. Ripley” como um dos seus filmes preferidos e recorreu a dois dos seus elementos para dois dos seus filmes (Gabriel Yared para a música de “The Lives of Others”, John Seale para a fotografia de “The Tourist” – que era um remake de um filme francês, “Anthony Zimmer”).

Tommy Wiseau ficou de tal modo emocionado ao ver o filme, que procurou fazer um ao mesmo nível – “The Room” (2003).

É o filme preferido de Matt Damon, dentro dos que fez.

Tom Ripley é um personagem muito visto no Cinema, com vários rostos –  Alain Delon (“Plein Soleil”, em 1960), Maurice Ronet (“Le Meurtrier”, em 1962), Dennis Hopper (“The American Friend”, em 1977), Matt Damon (“The Talented Mr. Ripley”, em 1999), John Malkovich (“Ripley’s Game”, em 2003) e Barry Pepper (“Ripley Under Ground”, em 2005).

Fizeram-se depois dois filmes protagonizados por Tom Ripley – “Ripley`s Game” (2002, com John Malkovich) e “Ripley Under Ground” (2005, com Barry Pepper), mas nenhum deles é sequela a “The Talented Mr. Ripley”.

 

Sobre Patricia Highsmith

https://www.britannica.com/biography/Patricia-Highsmith

https://www.goodreads.com/author/show/7622.Patricia_Highsmith

 

Patricia Highsmith em Portugal

https://relogiodagua.pt/autor/patricia-highsmith/

 

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