A Sereia do Mississipi (1969)

 

 

Título original – La Sirène du Mississipi

 

François Truffaut é um grande narrador de histoires d`amour.

Ei-lo a contar (mais) uma. E num registo bem noir.

 

Louis Mahé é um milionário no ramo da produção de tabaco. Julie Roussel é a sua noiva por correspondência.

O casamento dá-se e o fascínio acontece. Mas a “sereia” foge e ele parte no seu encalço.

Mistérios e cadáveres surgem.

Estamos no terreno do Poéte de l`Amour, dentro da sua cinefilia e também em ambientes atípicos ao autor de “L’Amour en Fuite”.

Tudo parece estarmos no campo de um filme romântico (aqui com o amor a surgir entre pessoas que só se conhecem por fotografias e pelo que dizem em cartas contínuas).

Mas rapidamente entramos pelo Film Noir (até porque o filme deriva de um romance de um mestre de tal género – Cornell Woolrich/William Irish) – temos o indivíduo normal metido em grandes trapalhadas criminais, a femme fatale, o passado dúbio, os comportamentos de ambiguidade moral, o negrume dos eventos.

Mas François Truffaut nunca foge do seu Cinema e da sua “ideologia”.

Todo o filme é um conto sobre um amour fou, onde o desejo, a posse e a obsessão se revelam cegos, incapazes e motivadores perante o Amor (que, no final, tudo redime).

E é um conto de todo um amour en fuite (mas não tão “divertido” como o filme que assinou com esse título), única forma de o viver.

E com uma magistral subtileza, é também um conto sobre um constante desejo carnal (só dele? ou também dela, ainda que reprimido?), magistralmente contado, ilustrado e representado.

É uma história com a presença da morte, do medo e da ameaça, mas é a vida e o amor que os rodeiam.

Excelentes ambientes naturais (os africanos e os franceses), muito bem filmados.

Jean-Paul Belmondo e Catherine Deneuve raramente estiveram tao belos, tão bem filmados e tão intensos.

Ele convence e comove pela sua obsessão e desejo por um amor que nem ele compreende ou controla (o seu rosto e voz quando diz a ela que não se importa de ser envenenado e morto por ela).

Ela é bem misteriosa, manipuladora e de uma fria sensualidade que não cessa de fascinar (a sua simplicidade quando chega, o seu look à noite, a forma como se nega e entrega no leito).

É um clássico do Maître (e do Cinema), com algumas diferenças face ao seu habitual, que se revela a histoire d`amour mais negra do autor, e que forma uma trilogia (precisamente de histórias de amor algo negras) com “La Mariée était en Noir” (1968) e “La Femme d’à Côté” (1981).

 

“La Sirène do Mississippi” não tem edição portuguesa. Existe noutros mercados, a bom preço.

Realizador: François Truffaut

Argumentista: François Truffaut, a partir do romance de Cornell Woolrich (“Waltz Into Darkness”, escrito como William Irish)

Elenco: Jean-Paul Belmondo, Catherine Deneuve, Nelly Borgeaud, Martine Ferrière, Marcel Berbert, Michel Bouquet

 

Trailer

 

Clips

 

Orçamento – 1.6 milhões de Dólares (equivalente)

Bilheteira – 33.000 Dólares (USA); 1.2 milhões de Espectadores (França); 1 milhão de Espectadores (Espanha); 1 milhão de Espectadores (Itália); 1.3 milhões de Dólares (mundial)

 

O romance de William Irish foi editado em 1947.

William Irish é um pseudónimo de Cornell Woolrich. Woolruich/Irish era um dos grandes escritores de Hardboiled Noir. Hitchcock adaptou-o em “Rear Window” (1954). Truffaut já o tinha adaptado em “La Mariée était en Noir” e a ele volta com “La Sirène du Mississippi”.

Truffaut leu o romance de Irish enquanto preparava “La Mariée était en Noir”. Truffaut é grande fã de Irish e leu tudo o que foi feito pelo escritor.

O argumento procura ser fiel ao romance, mas Truffaut tomou algumas liberdades que fossem mais fiéis ao seu Cinema.

Jean-Paul Belmondo é um dos “filhos” da Nouvelle Vague. François Truffaut é um dos “papás” da Nouvelle Vague. Belmondo trabalhou com outros fundadores da vaga (Jean-Luc Godard e Jean-Pierre Melville), mas este foi o único encontro entre Belmondo e Truffaut.

François Truffaut e Catherine Deneuve reencontrar-se-iam em “Le Dernier Metro” (1980, o grande campeão dos Césars desse ano).

Nelly Borgeaud voltaria a trabalhar com François Truffaut – “L’Homme qui aimait les Femmes” (1977).

Reencontro entre François Truffaut e Michel Bouquet, depois de “La Mariée était en Noir”.

Música de Antoine Duhamel, que já tinha trabalhado com Truffaut (“Baisers Volés”, em 1968) e voltariam a fazer parceria (“Domicile Conjugal”, em 1970).

Filmado no Sul de França e na Ilha Réunion.

Filmado por ordem cronológica. Truffaut queria que a relação entre Louis e Julie evoluísse ao ritmo da relação entre Jean-Paul Belmondo e Catherine Deneuve. Truffaut chegava a escrever alterações ao argumento durante a noite para as adaptar ao estado do à vontade entre os actores.

As roupas de Catherine Deneuve são de Yves Saint Laurent.

A casa onde Louis e Julie se refugiam na Suiça é a mesma que se usou como o esconderijo do gang de “Tirez sur le Pianiste” (1960).

O filme é dedicado a Jean Renoir, de quem Truffaut é grande fã.

Apesar do prestígio de François Truffaut e da popularidade de Catherine Deneuve e Jean-Paul Belmondo, o filme foi um insucesso nas bilheteiras.

Em 2001 viria um “remake” – “Original Sin” (já aqui visto) readapta o romance de Woolrich/Irish, de uma forma mais latina e erótica; Michael Cristofer escreve e realiza, com Antonio Banderas e Angelina Jolie.

 

Sobre Cornell Woolrich/William Irish

https://crimereads.com/the-noir-poetry-and-doomed-romanticism-of-cornell-woolrich/

https://www.goodreads.com/author/show/25413.Cornell_Woolrich

https://www.goodreads.com/author/list/247321.William_Irish

 

One comment on “A Sereia do Mississipi (1969)

  1. […] levado ao Cinema por François Truffaut com o excelente “La Siréne du Mississippi” (1969; já aqui […]

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