Título original – 48 Hrs.
Eis o filme que gerou a moda dos bubbdy-buddy movies e dos policiais cómicos.
Cineasta apto para o actioner urbano, uma bem escolhida dupla de protagonistas.
Num tempo em que passam 40 anos sobre o filme, dediquemos uma horas a este clássico.
Até porque já não de fazem filmes assim.
Albert Ganz, perigoso criminoso, foge da prisão com o seu cúmplice Billy.
Jack Gates, um duro polícia de San Francisco, confronta-se com ambos numa acção de rotina, mas eles fogem.
Reggie Hammond, pequeno vigarista ainda a cumprir pena, parece ser uma boa ligação a Ganz.
A parceria entre Jack e Reggie parece ser inevitável. Vai durar 48 horas. Se se conseguirem aturar e um não matar o outro.
Eis o filme que (re)definiu as regras do policial, do policial de acção, da comédia policial, do buddy-buddy movie (“Lethal Weapon”, feito 5 anos depois, faria uma nova reformulação, com resultados igualmente magníficos, seguindo outras vertentes humanas e relacionais, com mais profundidade emocional).
É uma magistral combinação de policial urbano, actioner e comédia, assente numa parceria improvável e num duelo de personalidades.
Há toda uma viagem ao dark side de uma grande metrópole (Walter Hill já tinha mostrado ser mestre nisso – “The Driver”, “The Warriors”), há uma abordagem do quotidiano da Polícia (o plano contínuo na esquadra enquanto se ilustra o protagonista a carregar a sua arma, a descobrir dados sobre o caso, interrogatório a uma testemunha e a dinâmica do local), há o entretenimento actioner (o filme arranca de forma violenta e não pára, há action quase a cada 10 minutos).
Mas o que marca mesmo é a dinâmica dos protagonistas.
A troca de lines é tão viril, cerrada, violenta e ágil, que parece quase um shoot-out verbal (“Bullshit”, “But it`s serious shit”; “… You`re gonna be sorry to met me”, “I`m already sorry”; “At least I`m not calling you shithead”, “I may call you worse than that”).
Tudo isto reforça o humor, mas é também revelador de personalidades, da afirmação de cada um dos protagonistas, um face ao outro.
Claro que tamanho duelo de “egos” origina uma boa amizade (os momentos em que ambos se revelam emocionalmente), originando momentos brutais (a luta entre Jack e Reggie) e desconcertantes (Cates a querer prosseguir a investigação, Hammond a querer comer uma refeição decente e saciar os seus apetites sexuais).
Boa fotografia de Ric Waite (um habitual de Hill), que captura bem o tom vibrante de uma grande cidade.
Electrizante banda sonora de James Horner (que depois faria algo ao mesmo nível em “Commando” e “Aliens”).
Walter Hill filma com fúria, energia, grande sentido de ritmo, acção bem encenada e muito, muito humor.
Uma boa parte da culpa da excelência (e relevância) deste filme está na química (perfeita) entre Nick Nolte e Eddie Murphy (a sua estreia cinematográfica). Nolte é excelente como durão (mas com coração) e Murphy parte a loiça toda com a sua descontração (atenção à cena no bar, quando Hammond se passa por agente da Polícia num grupo de rednecks).
Um verdadeiro triunfo renovador no género.
Um dos grandes policiais actioner de sempre.
Um clássico que seria tremendamente influente (a série “Miami Vice” e a saga “Lethal Weapon”).
“48 Hrs.” tem edição portuguesa, a bom preço.
Realizador: Walter Hill
Argumentistas: Roger Spottiswoode, Walter Hill, Larry Gross, Steven E. de Souza
Elenco: Nick Nolte, Eddie Murphy, Annette O’Toole, Frank McRae, James Remar, David Patrick Kelly, Sonny Landham, Brion James, Kerry Sherman, Jonathan Banks, James Keane, Tara King, Greta Blackburn, Margot Rose, Denise Crosby, Olivia Brown
Trailer
Clips
Nick Nolte sobre o filme
Orçamento – 12 milhões de Dólares
Bilheteira – 79 milhões de Dólares
“Grande Prémio”, no Festival du Film Policier Cognac 1983.
Nomeado para “Melhor Filme”, nos Edgar Allan Poe 1983. Perdeu “The Long Good Friday”.
Eddie Murphy foi nomeado para “Nova Estrela do Ano em Cinema – Masculino”, nos Globos de Ouro 1983. Perdeu para Ben Kingsley em “Gandhi”.
“Melhor Música”, pelos críticos de Los Angeles 1982.
Foi o produtor Lawrence Gordon que teve a ideia, já em 1971. Seria sobre o rapto da filha do Governador da Louisiana, que tinha 48 horas de vida se não pagassem o resgate. O mais implacável dos polícias faz parceria com um perigoso criminoso, ainda a cumprir pena, que tem relações com o raptor.
Em 1975, Gordon produz “Hard Times” (escrito e realizado por Walter Hill, no seu primeiro filme como realizador, com Roger Spottiswoode como editor). Spottiswoode tinha vontade de se tornar realizador e Hill aconselha-o a primeiro delinear um argumento para a ideia de Gordon.
Um primeiro argumento é escrito, com supervisão de Hill e é apresentado à Columbia Pictures. Tracy Keenan Wynn (que já tinha co-escrito com Hill “The Drowning Pool”, a segunda aventura de Paul Newman como Lew Harper) é chamado para fazer alterações.
O filme passa da Columbia para a Paramount, que vê aqui um vehicle para Clint Eastwood. Hill é chamado para alterações, adaptando-as para que Eastwood seja presidiário. Hill não gosta da ideia e sugere Richard Pryor (ídolo de… Eddie Murphy – trabalhariam juntos em “Harlem Nights”, em 1989, com Murphy a ser também argumentista e realizador) como o presidiário e Eastwood como o polícia.
Eastwood queria interpretar o presidiário e sai de cena. Ele interpretaria um presidiário, sim, mas em “Escape from Alcatraz” (1979, o último da parceria de Eastwood com Don Siegel).
Mickey Rourke, Jeff Bridges, Sylvester Stallone, Kris Kristofferson e Burt Reynolds recusaram interpretar Jack Cates. Rourke, Stallone e Bridges trabalhariam com Hill no futuro – “Johnny Handsome” (1989), “Wild Bill” (1995) e “Bullett to the Head” (2012), respectivamente.
O projecto fica parado. Mas Gordon e Joel Silver não o esquecem. Gordon aborda Hill com a ideia de ser Nick Nolte o polícia. Nolte é popular na série “Rich Man, Poor Man” e Richard Pryor já é uma movie star.
Nada avança por parte de Pryor.
Hill pondera Gregory Hines, mas este está ocupado (com “Cotton Club”, feito em 1984 por Francis Ford Coppola).
Howard E. Rollins Jr. e Denzel Washington são ponderados.
Hildy Gottlieb (manager de actores e namorada de Hill, na época) recomenda Eddie Murphy (que era cliente de Hildy), que estava com boa popularidade em “Saturday Night Live”.
O personagem Reggie Hammond chamava-se inicialmente Willie Biggs, mas Eddie Murphy pediu que fosse alterado, pois suava muito a cliché sobre pretos.
Steven E. de Souza (que escreveria “Commando”, “Die Hard”, “Die Hard 2” – modelos de combinação de actioner viril com comédia) chega para adaptar o argumento a Eddie Murphy.
Hill chama Larry Gross para revisões finais.
Hill queria um filme mais virado para os personagens do que para a intriga.
Gross deu as ideias de Reggie andar sedento de sexo, da relação de Jack com a namorada e reforçou os vilões.
Hill já tinha abordado o buddy-buddy movie – o seu primeiro argumento é “Hickey & Boggs” (1972, de Robert Culp, com o próprio Culp e Bill Cosby).
É o primeiro filme de Joel Silver como produtor. Até então ele tinha funções como co-producer, associate producer e executive producer. Silver produziria muitos blockbusters no campo do actioner (“Commando”, “Predator”, “Die Hard”, “The Matrix”) e voltaria a dar cartas no buddy-buddy movie (a saga “Lethal Weapon”).
É o primeiro filme de Roger Spottiswoode como argumentista.
É o primeiro filme de Eddie Murphy.
Eddie Murphy recebeu 450.000 Dólares e Nick Nolte recebeu 1 milhão de Dólares. Na sequela Murphy recebeu 7 milhões de Dólares e Nolte 3.
Reencontro entre Walter Hill e David Patrick Kelly, depois de “The Warriors” (1979). Em ambos Kelly interpreta um personagem de nome “Luther”, mas os personagens não são o mesmo.
Walter Hill reencontra alguns dos “The Warriors” (1979) – James Remar, Sonny Landham, Marcelino Sánchez e David Patrick Kelly.
Um de vários encontros entre Walter Hill e James Remar – “The Warriors” (1979), “48 Hrs.” (1982), “Wild Bill” (1995), “The Long Riders” (1980).
Walter Hill e Richard Pryor encontrar-se-iam em “Brewster`s Millions” (1985).
Richard Pryor e Eddie Murphy trabalhariam juntos em “Harlem Nights” (1989, escrito e realizado por Murphy).
Uma das muitas colaborações entre Lawrence Gordon e Walter Hill.
Nova colaboração entre David Patrick Kelly e Walter Hill – “The Warriors” (1979), “48 Hrs.” (1982), “Last Man Standing” (1996).
Nova colaboração entgre Brion James e Walter Hill – “Hard Times” (1975), “48 Hrs.” (1982), “Red Heat” (1988), “Southern Comfort” (1981), “Another 48 Hrs.” (1990).
Rencontro entre David Patrick Kelly e James Remar, depois de “The Warriors” (1979).
Walter Hill e Larry Gross trabalhariam juntos novamente em “Streets of Fire” (1984).
Larry Gross regressaria na sequela, “Another 48 Hrs.”.
Uma das muitas parcerias entre Joel Silver e Lawrence Gordon, bem como ente Gordon e Walter Hill.
Nick Nolte passou semanas a conviver com polícias de San Francisco.
James Remar passou alguns dias sem dormir, para conseguir ter um look cansado e psicótico.
Segundo Nolte, muitos dos diálogos entre ele e Murphy eram improvisados.
Denise Crosby chegou a magoar Eddie Murphy, numa cena.
Murphy entra nas filmagens semanas depois destas terem começado, pois ainda estava ocupado com “Saturday Night Live”.
Os studio executives não gostavam da performance de Murphy e queriam-no despedir. Hill e Nolte impuseram a vontade de o manter. “Curiosamente”, Murphy e a Paramount fizeram vários filmes juntos, quase todos de comédia (e com sucesso – pelos vistos, o público achava piada a Murphy) – a começar logo pela saga “Beverly Hills Cop”, mas também “Trading Places”, “The Golden Child”, “Coming to America”, “Harlem Nights”.
Hill teve problemas com os studio executives. Michael Eisner (na época, líder da Paramount, futuro líder da Disney) achava que o filme não era suficientemente cómico. Assim sendo, Hill e Gross criam mais momentos de confrontação entre Jack e Reggie, onde ambos vinquem as suas personalidades.
O tiroteio no hotel foi considerado demasiado violento, para um filme que se pretendia também cómico. Os studio executives asseguram que Hill jamais voltará a trabalhar com o estúdio (ooops, a sequela “Another 48 Hrs.” é com produção da Paramount e com realização de… Walter Hill).
Ric Waite, o director of photography, usou a película Kodak 93, muito rápida para filmagens nocturnas e interiores. Isto minimizava recursos de iluminação, permitindo as filmagens serem mais rápidas. Waite e Hill já tinham trabalhado juntos e voltariam a fazê-lo.
Eddie Murphy disse que não sabia interpretar com uma arma, pelo que improvisou baseado em Bruce Lee e nas suas expressões quando ia lutar.
Numa versão prévia do argumento, os protagonistas eram dois polícias (tal seria usado em “Miami Vice” e “Lethal Weapon”).
Num primeiro cut, a presença de Annette O’Toole era mais relevante.
Jack Cates foi a inspiração para o personagem James “Sonny” Crockett da série “Miami Vice” (1984; o personagem é interpretado por Don Johnson). Curiosamente, Olivia Brown (secundária em “48 Hrs.”) participa na série.
Na prisão, Reggie canta “Roxanne”, dos The Police. Faria o mesmo na sequela.
A line “Forget this man, we ain’t brothers, we ain’t partners, and we aint’ friends” é usada em “Die Hard With a Vengeance” (1995).
O carro de Jack Cates é um Cadillac DeVille 1964 convertible. Jack teria outro modelo igual em “Another 48 Hrs.”.
O Cadillac foi comprado por Vanilla Ice, sendo todo restaurado.
O carro de Reggie Hammond é um Porsche 356 Speedster.
O carro de Reggie tem a mesma matrícula (487 BAK) do Pontiac Firebird Esprit 1977 que Ryan O’Neal conduz em “The Driver” (1978, também produzido por Lawrence Gordon, também escrito e realizado por Walter Hill).
O fato de Reggie é desenhado por Giorgio Armani. Na época custava 957 Dólares.
O bar já tinha sido visto em “When a Stranger Calls” (1979) e seria novamente usado em “Brewster’s Millions” (1985, também de Walter Hill, com Richard Pryor).
A banda “The Busboys” estaria presente em muitos espectáculos de Eddie Murphy. Murphy juntava-se à banda frequentemente, nas pausas das filmagens.
O revolver de Jack Cates é uma Smith and Wesson model 29 .44 magnum. A pistola que a substitui é uma Colt 1911 A1 .45 automatic.
A arma de Reggie Hammond é uma Smith and Wesson model 19 357 magnum.
A arma de Billy Bear é uma Colt New Frontier.
Há um pormenor narrativo (um polícia na recuperação da sua arma roubada por um criminoso) que deriva de “Stray Dog” (1949, realizado por Akira Kurosawa).
A garagem onde Reggie tem o seu carro é a mesma onde o protagonista de “Roadhouse” (1988) guarda o seu carro.
O bar chama-se “Torchy’s”. Em vários filmes de Walter Hill há um bar com esse nome.
Body Count – 9.
A palavra “Fuck” é usada… 48 vezes. Pensa-se ser coincidência.
Um par de cenas ficaram de fora:
- Jack e Elaine a passear em Chinatown, de dia, depois do tiroteio no hotel e da cena na esquadra, mas antes de Jack ir busvar Reggie à prisão. A cena mostra Jack mais sentimental com Elaine e mostra-o a explicar a sua ansiedade em capturar Ganz.
- A cena de Reggie no bar é mais longa e mostra-o a meter-se com as meninas.
Estreou em #3 no box-office (atrás de “The Toy” e “Airplane II: The Sequel”), mas tornou-se um enorme sucesso.
A reacção da crítica foi igualmente entusiasmante, considerando “48 Hrs.” como um dos melhores filmes do ano, elogiando os diálogos, a realização de Hill, as interpretações de Nolte e Murphy, a química entre ambos e a revelação de Murphy como comediante de alto nível.
Um dos posters foi retocado no Reino Unido. Onde Eddie Murphy mostra o “dedo do meio”, agora tinha a mão empunhada como se fosse dar um murro.
O início de carreira de Eddie Murphy neste filme foi considerado um dos mais sensacionais em Cinema.
Walter Hill achou engraçado que considerassem o filme como um buddy-buddy movie, quando os protagonistas não se suportam um ao outro.
Apesar de ser considerado como o primeiro buddy-buddy movie, “48 Hrs.” é antecedido por “Freebie and the Bean” (1974 de Richard Rush, com James Caan e Alan Arkin). Mas a pequena visibilidade deste filme impede-o de ser relevante.
O género explodiu e não tardaram a surgir “rip-offs” – “Lethal Weapon” (talvez o modelo mais emblemático do género), “Bad Boys”, “Rush Hour”, “Tango and Cash”, “Kiss Kiss Bang Bang”, “The Nice Guys”. Shane Black seria o grande nome do género (escreveu “Lethal Weapon”, Kiss Kiss Bang Bang”, “The Nice Guys”).
Walter Hill considera que o personagem Axel Foley (da saga “Beverly Hills Cop”) é um rip-off de Reggie Hammond. Ambos são interpretados por Eddie Murphy e fizeram dele uma enorme movie star.
James Horner reutilizaria o seu main theme em “Comando” (1985, também com produção de Lawrence Gordon e Joel Silver).
Walter Hill e Nick Nolte voltariam a trabalhar juntos – além da sequela “Another 48 Hrs.” (1990), também “Extreme Prejudice” (1987).
Walter Hill e Eddie Murphy reencontrar-se-iam na sequela “Another 48 Hrs.”. Mas durante algum tempo estiveram ligados a um remake de “The Magnificent Seven” (que aconteceria, mas por Antoine Fuqua, com Denzel Washington).
Sonny Landham interpreta um personagem de nome Billy Bear. Em “Predator” (1987) também interpreta um personagem de nome Billy. Em ambos ele aparece em tronco nú. Ambos os filmes são produzidos por Lawrence Gordon e Joel Silver. Sonny iria protagonizar e realizar um filme chamado “Billy Lone Bear” (1996).
Bollywood faria dois remakes – “Andar Baahar” (1984) e “Police File” (1992).
Em 2007, o IGN considerou “48 Hrs.” como o “Terceiro Melhor Filme no Género “Buddy Cop Film”.
Em 2017, alguém falou em remake – os irmãos Safdie iam ser os responsáveis. Ainda nada avançou.
“48 Hrs.” teria sequela – “Another 48 Hrs.” (já aqui visto)) em 1990, que reuniu Walter Hill, Nick Nolte e Eddie Murphy. O filme foi um sucesso, mas não teve boa recepção da crítica, que considerou como um remake do filme original.
[…] Hrs.” (1982, já aqui visto) tinha sido um enorme sucesso e tinha feito […]