Título original – No Time to Die
E cá está ele, finalmente (após mais de um ano de espera).
O regresso de James Bond.
Na sua 25ª aventura.
E a última com Daniel Craig.
James Bond já está retirado do MI6 e vive em sossego na companhia de Madeleine Swann (a menina que ele conheceu em “SPECTRE”, o episódio anterior).
Mas o seu amigo Felix Leiter vem-lhe pedir ajuda.
Para 007 é o regresso ao activo, o enfrentar de uma ameaça tenebrosa e a revelação de muitos segredos que envolveram as suas missões anteriores.
A terceira sequela (a “Casino Royale”) da fase Daniel Craig torna-se a mais bem conseguida e devolve a saga ao melhor que se tinha delineado nesse episódio inicial.
Voltamos a ter a abordagem psicológica e emocional a Bond (não é difícil vermos aqui um “remake” de “On Her Majesty`s Secret Service” – sempre defendi a ideia que a fase Daniel Craig seria perfeita para se “refazer” este título e assim se fazer um arco narrativo), e de uma forma (profunda, dramática e trágica) como raramente se viu antes (resulta divertido e comovente ver 007 a… cozinhar – yup, depois de MacGyver, James Bond é o primeiro action hero a saber fazer algo na cozinha – e dialogar com uma… criança).
Voltamos a ver Bond de coração aberto e dilacerado (já não o víamos assim desde “On Her Majesty`s Secret Service”, “The World is Not Enough” e “Casino Royale”).
Voltamos a ver Bond feito “cavaleiro branco” face à donzela e a aceitar as consequências (a dedicação de Bond a uma menina só tem paralelo em “From Russia With Love” e “The Living Daylights”).
Corrigindo uma superficialidade de “Skyfall”, aborda-se melhor a reforma de Bond, o seu bem-estar em tal e o porquê (moral) do seu regresso.
Inteligentemente, e nisso o filme consegue tudo o que nenhuma das sequelas anteriores conseguiu, faz-se um “closure” na memória de Vesper (é igualmente comovente e doloroso o momento em que Bond confessa “I miss You”), corrigindo-se assim as (muitas) gafes cometidas nessa área em “Quantum of Solace” (esse é que era o episódio onde tal memória, dor e closure devia ter sido devidamente abordada e resolvida).
Ora, do ponto de vista emocional estamos bem e o fã sorri por se ver (finalmente) a devida (e profunda) abordagem que certos temas tiveram cobertura superficial (e até mesmo banal) nas sequelas anteriores.
E até vemos Bond a rumar para um happy end definitivo (como se tentou em “On Her Majesty`s Secret Service” e se sugeriu em “SPECTRE”).
Mas isto é um James Bond Movie.
E, como tal, queremos o que é de esperar de tal.
E aqui, também nada a temer.
Temos uma intriga plena de twists & turns, muitas surpresas, bem contada e devidamente rebuscada.
Temos boa action, boas set pieces, loucas perseguições, brutais lutas, muita bala disparada e um elevado body count.
Temos uma tenebrosa ameaça ao mundo, seguindo assim alguma da tradição bondiana (e até algo provocatória nestes tempos actuais de pandemia – quão profético é o filme!!!).
E há uma bonita e emotiva canção de Billie Eilish, bem adequada às emoções da história.
E porque estamos em despedida (de um actor) e quase a chegar aos 60 anos da saga (“Dr. No”, o primeiro filme, é de 1962), o filme não esquece o passado, a boa memória e os clássicos (sejam os filmes, sejam os fãs).
Para regozijo de muitos (e sempre bem inserido na narrativa e na emoção presente) temos evocações a “On Her Majesty`s Secret Service” (não apenas o tom da narrativa, mas também a frase “We have all the time in te world”, bem como a sonoridade de John Barry para esse filme e a canção de Louis Armstrong), a “For Your Eyes Only” (a execução prática e destrutiva de um inimigo, livrando-o de um… peso), a “You Only Live Twice” e “The Spy Who Love Me” (o covil do vilão e o duelo final, com o set a recordar os incríveis sets criados por Ken Adam em vários episódios da saga), “To Live and Let Die” (o gadget do relógio) e até à memória de Ian Fleming (o local da casa de Bond na reforma recorda a “Goldeneye” onde Fleming terminou os seus dias).
Para os puristas, eis vários regressos do mítico Aston Martin. Ou melhor, de três Aston Martin. O DB5 (estreado em”Goldfinger” e regressado em “Thunderball”, “Goldeneye”, “Casino Royale”, “Skyfall” e “SPECTRE”), o DBS (de “On Her Majesty`s Secret Service”) e o Volante (de “The Living Daylights”). E como sinal dos tempos, o novo DBS Superleggera.
Infelizmente, nem tudo é redondinho.
Há que lamentar um chato e banal score de Hans Zimmer (um compositor muito overrated). Que saudades de David Arnold (perante o que ele fez em “Casino Royale” e as emoções deste “No Time to Die”, o que ele faria…)
A fotografia é muito rotineira (saudades de Phil “Casino Royale” Meheux e de Roger “Skyfall” Deakins).
O vilão é de pacotilha (como o foram todos os vindos depois de “Casino Royale”), limitando-se a ser mais um menino que só quer destruir o mundo e conquistar poder (já é hora de “mudar o disco” na saga, OK?).
E o final. Mas já lá iremos.
Cary Joji Fukunaga cumpre o que é de esperar num realizador que vai para a saga – dá um ritmo vivo (as quase 3 horas de metragem passam a voar), filma bem os locais bonitos, cria boa acção, elogiando-se a forma como consegue uma densa atmosfera emocional.
Não consegue evitar umas certas semelhanças com a concorrência (os shootouts no final, em plano contínuo, recordam a saga “John Wick” ou um videogame em regime first person shooter), caindo assim (ligeiramente) no erro que Marc Forster caiu em “Quantum of Solace” (levar a action para os tons da concorrência – aqui, a saga “Jason Bourne”).
Felizmente que em campo pela Second Unit está Alexander Witt, um connaisseur da saga nesta fase (andou por “Casino Royale”, “Skyfall” e “SPECTRE”; “Quantum of Solace” recorreu a Dan Bradley, que andou pela saga… “Jason Bourne”).
Nota brava para o prólogo – não é só o mais longo da saga, é mesmo um filme autónomo na mesma, com eventos, emoções e acção que permitem um episódio extra.
Elenco com bons nomes, muitos deles já veteranos na saga.
Todos cumprem.
Rami Malek coloca na sua performance aquilo que o “papel” não dá – poder inquietante e presença.
Lashana Lynch cria uma agente (00… surpreendam-se com o que vem a seguir) digna de (alguma) atenção, em sintonia com o “feminismo” dos tempos modernos. Mas só por cego feminismo (e cego seguimento com o “politicamente correcto” destes dias) é que pode ser vista como o futuro da saga.
Ana de Armas é uma grande kick-ass girl, é a que mais se (e nos) diverte (num filme bem carente de humor – mas os eventos assim o explicam), é a que mais nos cativa (que beleza estonteante!!!), merecendo regressar o mais depressa possível.
Léa Seydoux consegue mais alguma convicção emocional que a mostrada em “SPECTRE”.
Daniel Craig está em forma. Seja como herói (bem implacável), seja como pessoa (bem emotiva e vulnerável). É o seu melhor trabalho como James Bond depois de… “Casino Royale”.
É a despedida emotiva (e devidamente espectacular) a Daniel Craig.
É o final (fechado) de uma fase complexa e fascinante de um ícone eterno da cultura popular mundial, que muito fez por redefinir o personagem e dar-lhe uma espessura nunca vista.
E…
É toda uma experiência emocional que a saga só nos deu duas vezes (“On Her Majesty`s Secret Service” e “Licence to Kill”).
Atenção às surpresas e reviravoltas no terceiro acto, e preparem-se para o inesperado.
E um final que…
Pois, lá vamos para um outro episódio da saga, para certas emoções.
(e que episódio é esse? ahhh, isso seria um imenso spoiler)
E a controvérsia não vai tardar, acreditem.
É o final adequado? Sim e Não. Pela closure que se pretendia a James Bond, certamente que o final deveria ser outro. Pela “ideologia” dos tempos modernos, traz um certo “moralismo”.
Se “On Her Majesty`s Secret Service” é o “patinho feio” da saga (George Lazenby como sucessor a Sean Connery, o tom mais dramático e romântico, o final trágico), “No Time to Die” corre o risco de ser “o maldito” da saga.
Mas, como disse, a controvérsia está fabricada e vai dar que falar. Mas só até ao próximo filme.
“No Time to Die” já está nas nossas salas.
Realizador: Cary Joji Fukunaga
Argumentistas: Neal Purvis, Robert Wade, Cary Joji Fukunaga, Phoebe Waller-Bridge, a partir do personagem criado por Ian Fleming
Elenco: Daniel Craig, Léa Seydoux, Ralph Fiennes, Rami Malek, Lashana Lynch, Naomie Harris, Ana de Armas, Christoph Waltz, Billy Magnussen, Ben Whishaw, Jeffrey Wright, Rory Kinnear
Site – https://www.007.com/no-time-to-die/
A canção de Billie Eilish
Orçamento – 250 milhões de Dólares
Bilheteira (até agora) – 56 milhões de Dólares (USA); 313 (mundial)
É o quinto e ultimo filme de Daniel Craig como James Bond.
Craig torna-se o terceiro actor que interpreta 007, com mais de 50 anos ao interpretar o personagem pela última vez – Roger Moore tinha 57 em “A View to a Kill” (1985), Sean Connery tinha 53 em “Never Say Never Again” (1983). Craig tinha 51.
Com uma presença ao longo de 15 anos (“Casino Royale”, a estreia de Craig como 007, é de 2006), Craig torna-se o mais duradouro actor na saga e um dos com mais filmes (5 filmes, contra os 5+1+1 filmes e 5+1+1 anos de Sean Connery; 7 filmes e 12 anos de Roger Moore).
Danny Boyle era o realizador inicial. Boyle assinou um momento entre James Bond (Daniel Craig) e a Rainha de Inglaterra, para os Jogos Olímpicos de Londres … . Mas Boyle teve fortes conflitos criativos (não queria o final delineado) com os produtores e viu-se despedido. Cary Joji Fukunaga foi o escolhido.
Outros realizadores considerados foram Jean-Marc Vallée, David Mackenzie, Denis Villeneuve, Yann Demange, Edward Berger, Paul McGuigan, Christopher McQuarrie, S. J. Clarkson e Edgar Wright.
Títulos iniciais – “Eclipse”, “Shatterhand”, “A Reason to Die”.
Phoebe Waller-Bridge é a segunda mulher a escrever para a saga, depois de Johanna Harwood em “From Russia With Love” (1963).
Reencontro entre Daniel Craig e Ana de Armas, depois de “Knives Out” (2019, que vai ter sequela). Craig exigiu a presença da actriz.
Depois de Eunice Gayson (a Sylvia Trench de “’Dr. No” em 1962, e “From Russia With Love” em (1963), Léa Seydoux torna-se a segunda Bond Girl a repetir a sua participação com a mesma personagem. Maud Adams participou em dois filmes (“The Man with The Golden Gun” em 1975, e “Octopussy” em 1983), mas com personagens diferentes.
É o primeiro filme da saga filmado em IMAX.
Foi também filmado com câmaras Panavision 65mm.
É o mais caro filme da saga.
É o mais longo filme da saga – 163 minutos.
Craig aleijou-se várias vezes nas cenas de acção.
Sinal dos tempos – surge um Aston Martin… eléctrico.
Circulou o rumor que o filme terminaria com a morte de… James Bond.
O filme ia estrear em Abril de 2020, mas foi sempre alvo de adiamentos devido à pandemia Covid-19.
Sobre Ian Fleming
https://www.britannica.com/biography/Ian-Fleming
https://jamesbond.fandom.com/wiki/Ian_Fleming
https://www.goodreads.com/author/show/2565.Ian_Fleming
Sobre James Bond