As Portas do Céu (1980)

 

Título original – Heaven’s Gate

 

Eis o filme que levou à ruína a United Artists.

É um dos maiores flops de sempre. E um verdadeiro “bombo de festa”.

Foi uma produção complicada, com muitos cuts (só recentemente é que tivemos o esplendor do Director`s Cut).

Michael Cimino vinha de “The Deer Hunter” (1978), com sucesso e muitos Oscars. As “portas do céu” pareciam abertas a ele. Mas foram mesmo uns “portões do inferno”.

Foi/é justo?

NÃO.

Mais de 4 décadas depois, vamos mesmo devolver o céu a esta obra-prima de Cinema.

 

1890, Johnston County, Wyoming.

É uma povoação carregada de imigrantes, quase todos a trabalhar na agricultura. Mas os seus interesses chocam com os barões do gado.

E assim se inicia uma guerra.

Saga épica dos colonos europeus (vindos da Europa de Leste) nos USA, que ilustra a sua luta contra o preconceito e algum racismo.

Ilustração do efeito nefasto do capitalismo quando este só visa dinheiro e poder em detrimento de pessoas.

Choque de amigos devido aos diversos intere$$es em campo.

Reflexão sobre uma época dos USA (a Civil War tinha terminado há pouco) ainda em conflito (consigo própria – o governo americano autoriza que uma corporação contrate mercenários para matar cidadãos americanos, ainda que oriundos de outros países).

Cruzada de um homem idealista e de valores, com alto nível de educação (formado numa prestigiada universidade) e posição social, em luta contra o poder financeiro e empresarial e do lado do proletariado.

A par do (tremendo) poder visual do filme, este não cessa de fazer uma análise/crítica sobre como algum poder da nação americana assentou sobre poder financeiro acima do poder humano, grandes corporações a dominar pequenas e a relatividade da liberdade num país que tanto prega sobre ela.

O filme acaba por ser, portanto, também (ou acima de tudo) um manifesto político e histórico, pois não é sobre good guys v bad guys ou mero conflito de interesses, mas sim uma visão sobre luta de classes, fazendo uma desconstrução (tremenda) sobre o american dream e sobre algumas das ilusões onde ele (ainda) vive.

E no meio da crítica/análise, o resignar – não há como vencer certos poderes, por muita luta que se dê (o destino final do protagonista, onde é visível a sua tristeza e cansaço, face à luta que travou e aos seus valores).

O filme tem um dos finais mais pessimistas, tristes e desencantados de todo o Cinema.

E isso reflecte aquilo que “Heaven`s Gate” (também) é – a jornada de desilusão/decepção de um homem, erudito e abastado, a procurar viver de acordo com os seus ideais e de protecção ao “proletariado”, mas a descobrir que tal é uma luta inglória.

Feliz é o título – é sobre a procura de umas “portas do céu” por parte de muita gente, mas para se revelar um “portal para o inferno” (e estas expressões até ganharam um significado extra, cínico e cruel em termos de bastidores e carreira em Hollywood para com o realizador e o protagonista).

O filme é todo ele um (enorme) festim visual.

Veja-se o momento dos discursos de fim de curso na faculdade, o baile no jardim da faculdade, a chegada à cidade, o baile colectivo e a dança a dois, os momentos íntimos nos interiores, o uso da paisagem, as cavalgadas, o confronto final.

É toda uma herança do Cinema épico clássico a mostrar que tinha continuidade na nova geração de filmmakers.

Impressionante trabalho nas áreas de cenografia (a cidade, os interiores), guarda-roupa e fotografia (tanto em exteriores como nos interiores).

O recente (e esplendoroso) master melhora mais todas estas virtudes, sendo mais visível na fotografia (agora viva, nítida e cristalina – na época, foi muito criticada por ser muito sépia e criar demasiado a sensação de pó no ar).

Excelente elenco, todo ele em excelente performance.

Michael Cimino assina com uma mestria notável, plena de sentido cinematográfico e épico, cheio de detalhe e cuidado, tão atento ao poder visual como humano.

Tal como em “Thunderbolt and Lightfoot”, “The Deer Hunter”, “Year of the Dragon”, “The Sicilian” e “Desperate Hours”, Cimino volta a mostrar a desconstrução, desilusão, decepção e ruína do american dream, sendo bem analítico e crítico.

“Heaven`s Gate“ é a sua obra-prima e o título pelo qual será sempre recordado (para bem e para mal), a par com “The Deer Hunter” (mas aqui mais pelo bem).

Há nada de insultuoso em evocar a memória de “Birth of a Nation”, “Gone With The Wind”, “Lawrence of Arabia”, “Doctor Zhivago”, “Spartacus”, “Cleopatra”.

Aliás, “Heaven`s Gate” acaba por ser um d` “os últimos dos duros” neste tipo de encenação e produção. “Sorcerer” (1978, outro “filme maldito”, de filmagens complicadas e imenso flop, de William Friedkin – que, tal como Cimino, também vinha de sucesso e Oscars – “The French Connection” e “The Exorcist”), “Apocalypse Now” (1979, de Francis Ford Coppola, outro filme marcado por filmagens bem complicadas) “Once Upon a Time in America” (1984, de Sergio Leone, também de produção e estreia complicada, com direito a muitos cuts), “Chariots of Fire” (1982), “Greystoke: The Legend of Tarzan, Lord of the Apes” (1984) são alguns dos “duros” contemporâneos, que devolviam essa encenação épica clássica, por parte de novos filmmakers. E depois só mesmo Kevin Costner para retomar este espírito e produção (“Dances With Wolves” em 1990 e os “malditos” “Waterworld” em 1995 e “The Postman” em 1997 – títulos que receberam o mesmo tratamento que “Heaven`s Gate”, embora com destino$ diferentes) e Mel Gibson (“Braveheart”, em 1995) para se encerrar um capítulo neste estilo de produção.

Maldito na sua época, o filme tem recebido (finalmente) a (merecida) redescoberta, reavaliação e apreciação.

Merece. Totalmente.

É toda uma obra de Arte.

Um épico tremendo, um feito cinematográfico único, um festim visual e narrativo mais actual do que nunca.

Um clássico.

Absolutamente obrigatório.

 

“Heaven`s Gate” não tem edição portuguesa. Existe noutros mercados a bom preço. Cuidado, pois algumas dessas edições têm o master antigo (fotografia muito sepia) e o cut mais curto. Procure-se, claro, o director`s restored cut. A Criterion Collection tem uma (excelente) edição, com o director`s restored cut, o novo e excelente master, e está bem guarnecida de extras, só que paga-se bem.

Realizador: Michael Cimino

Argumentista: Michael Cimino

Elenco: Kris Kristofferson, Christopher Walken, John Hurt, Sam Waterston, Brad Dourif, Isabelle Huppert, Joseph Cotten, Jeff Bridges, Geoffrey Lewis, Richard Masur, Mickey Rouke, Paul Koslo, Terry O’Quinn, Tom Noonan, Willem Dafoe (sem crédito)

 

Trailers

 

Clips

 

A banda sonora de David Mansfield

 

Making of

 

Sobre a produção

 

Isabelle Huppert sobre Michael Cimino

 

Jeff Bridges sobre “Heaven`s Gate”

 

Sobre dois dos Cuts

 

Michael Cimino a apresentar o seu Director`s Cut

 

Orçamento – 44 milhões de Dólares

Bilheteira – 3.4 milhões de Dólares

 

Nomeado para “Melhor Cenografia”, nos Oscars 1982. Perdeu para “Raiders of the Lost Ark”.

Nomeado para a “Palme d’Or”, em Cannes 1981. Perdeu para “Czlowiek z Zelaza”, de Andrzej Wajda.

“Pior Realizador”, nos Razzie 1982. Também teve nomeações para “Pior Filme” (“Mommie Dearest” foi eleito), “Pior Actor” (Kris Kristofferson perdeu para Klinton Spilsbury em “The Legend of the Lone Ranger”), “Pior Argumento” (“Mommie Dearest” foi preferido), “Pior Música” (“The Legend of the Lone Ranger” foi o escolhido – com música de… John Barry).

“Pior Realização”, nos The Stinkers Bad Movie 1981. Também esteve nomeado para “Pior Filme” (venceu “Mommie Dearest”), “Pior Argumento” (“Thief” de Michael Mann foi, pasme-se, o escolhido), “Pior Música” (os Tangerine Dream, por “Thief”, foram, surpreendentemente, “vencedores”).

Pré-produção

Cimino há muito que andava a investigar as “Johnson County Wars”.

Cimino escreveu uma primeira versão do argumento em 1971. “The Johnson County War” era o titulo. Apresentou-o a diversos estúdios. Foi recusado e não conseguiu atrair movie stars.

Em 1974 Cimino estreia-se na realização com “Thunderbolt and Lightfoot” (com Clint Eastwood e Jeff Bridges) e o filme é um sucesso (de público e critica).

Em 1979 há o sucesso nos Oscars e na bilheteira de “The Deer Hunter”.

Cimino parece bem visto na indústria e ele volta à carga com “The Johnson County War”. Ganha o interesse da United Artists (na época, muito interessada em projectos diferentes, inovadores e de qualidade – já tinha dado “Rocky”, “Annie Hall”, “Bananas”, “Last Tango in Paris”, “Network”, “Apocalypse Now”, “One Flew Over The Cuckoo’s Nest”, sem ignorar títulos comerciais como a saga “James Bond”, “Gator”, “Convoy”, “The Mechanic”). Recebe um orçamento inicial de 11.6 milhões de Dólares, liberdade total e a promessa de um grande elenco.

Perante o sucesso (e Oscars) de “The Deer Hunter” (1978), a United Artists estava disposta a tudo e a dar tudo a Michael Cimino.

Cimino escolheu Isabelle Huppert depois de a ver em “Violette Nozière” (1978).

Isabelle Huppert venceu a concorrência de Jane Fonda, Sally Field, Diane Keaton, Raquel Welch e Ali MacGraw.

Era o segundo filme de Huppert em Hollywood, depois de “Rosebud” (1975).

Huppert preparou-se ao passar dias num bordel em Wallace, Idaho.

Isabelle Huppert foi chamada mas contra a vontade da United Artists. Era uma insistência de Cimino. Se não concordassem, ele mudaria a produção para a Warner Brothers.

Numa entrevista a Cimino, o entrevistador mostrou o seu pasmo pela escolha da actriz por ser tão pouco apelativa para um duelo sentimental entre Kris Kristofferson e Christopher Walken. O realizador mandou ao entrevistador um “fuck you”.

John Wayne chegou a ser considerado como protagonista, quando o projecto ainda se movia nos 70s.

Chegou a ser anunciado como um filme realizado por Michael Winner, com Steve McQueen. McQueen faria nesse ano “Tom Horn”, também um western baseado num evento e personagem verídicos.

Clint Eastwood, Steve McQueen, Paul Newman e Robert Redford foram considerados como protagonista. Kris Kristofferson seria o eleito.

Era o segundo western de Kris Kristofferson, depois de ”Pat Garrett and Billy The Kid” (1973, de Sam Peckinpah). Kristofferson regressaria ao género com “Stagecoach” (1986), “The Last Days of Frank and Jesse James” (1986), “The Tracker” (1988), “Two for Texas” (1998), “Outlaw Justice” (1999) e “Comanche” (2000).

Reencontro entre Michael Cimino e Christopher Walken, depois de “The Deer Hunter” (1978, que deu Oscar a Walken).

Reencontro entre Michael Cimino e Jeff Bridges, depois de “Thunderbolt & Lightfoot” (1974, a estreia de Cimino como realizador).

Jeff Bridges foi considerado para o personagem que foi entregue a Christopher Walken.

Jeff Bridges teve um bisavô de nome… John Bridges. É o nome do personagem de Jeff no filme.

Michael Cimino e Mickey Rourke reencontrar-se-iam em “Year of the Dragon” (1985; o filme que acabou com o “jejum” de Cimino) e “Desperate Hours” (1990).

Primeiro filme de Terry O’Quinn. A sua treinadora de equitação tornar-se-ia a sua esposa.

Jack Lemmon foi considerado para o personagem que foi entregue a Joseph Cotten.

John Williams ia compor a música. Mas teve de sair devido aos atrasos nas filmagens e aos compromissos com “The Empire Strikes Back” e “Raiders of the Lost Ark”.

Fala-se que Ennio Morricone foi considerado.

Filmagens

As filmagens começam em Abril de 1979, no Montana, no Glacier National Park.

Filmado maioritariamente no Montana, mas também se filmou em Wallace, Idaho.

Filmado sempre em locais reais e ao ar livre, sem recurso a estúdio.

Filmado em 70mm.

A cenografia precisou de 150 carpinteiros.

Fora usados mais de 2.500 extras.

O elenco teve de entrar no que se chamou o “Camp Cimino” – todo o elenco teve de aprender a dançar, cavalgar, usar armas de fogo, conduzir carruagens, andar de patins, dielectos e (no caso de Huppert) aprender Inglês.

John Hurt ficou tanto tempo à espera de ser chamado para filmar, que filmou e concluiu “Elephant Man” (1980) e regressou a “Heaven`s Gate”.

Tom Noonan teve de esperar semanas para ser chamado para filmar.

Willem Dafoe tem aqui o seu primeiro filme. É um dos treinadores na luta de galos. O seu nome não é creditado no genérico. O seu personagem ia ser mais relevante e ter mais tempo. Mas num momento, Dafoe ri-se bem alto de uma anedota que um extra lhe contou. Cimino levou a mal (julgou que era sobre ele) e despediu o actor.

O personagem de Jeff Bridges era de pouca importância. Mas Cimino gostou tanto do trabalho do actor, que lhe deu mais cenas. Isto obrigou a uma reescrita do argumento.

Brad Dourif esteve numa festa organizada por Michael Douglas (na época muito activo como produtor – “One Flew Over The Cuckoo’s Nest”, “The China Syndrome”), onde estavam presentes muitos realizadores. Muitos deles viram os seus projectos na United Artists a serem adiados ou cancelados devido aos esforços movidos para “Heaven`s Gate”.

O orçamento e prazo de filmagens rapidamente ficaram ultrapassados.

Rapidamente surgem atrasos, e logo na primeira semana. Ao fim de seis dias de filmagem já estão cinco de atraso. Tudo porque Cimino era muito perfeccionista e fazia imensos takes.

Cimino é de tal modo perfeccionista e detalhado que manda reconstruir várias componentes do set só porque não tinham o aspecto e dimensão que ele quer (chega-se a falar da largura de uma rua).

Para um detalhe do set, Cimino não gostou da distância entre dois edifícios, pelo que pediu para se construir tudo de novo. E lá foram mais… 1.2 milhões de Dólares.

A loucura perfeccionista de Cimino era tal, que ele mandou criar um sistema de rega para o campo onde decorre a batalha final.

Cimino era de tal modo perfeccionista, que a média de takes para cada cena era de 50.

Muitos planos foram filmados na denominada “Magic Hour“. Dada a curta duração de tal (meia-dúzia de minutos, quando o sol se põe e a fotografia consegue uma bela tonalidade de azul), isto levou a muitos mais atrasos.

Falou-se que Cimino chegou a esperar por certa disposição de nuvens para filmar.

Cimino era de tal modo perfeccionista e autoritário, que havia quem o denominasse como “The Ayatollah”.

O estúdio quis perceber porque se estava a pagar tanto na renda de uns terrenos onde ocorriam as filmagens. Descobriu-se que o dono era… Michael Cimino.

O estúdio considerou despedir Cimino e teve conversações com Norman Jewison para o substituir. Jewison recusou.

Chegou-se a falar em David Lean para concluir as filmagens.

Cimino tinha um contrato blindado, que o protegia contra acções se o filme descarrilasse em matéria de orçamento.

Sam Peckinpah apareceu o set, para ajudar Cimino na cena da batalha final.

Um nevão causou atrasos nas filmagens exteriores. Cimino decide filmar em interiores. Mas como estes ainda não estão prontos, há que criá-los com rapidez. Mais pessoas, mais tempo, mais dinheiro.

Os gastos diários chegam a 200.00 Dólares.

Cimino estava de tal modo empenhado no projecto, que sempre acreditou que seria a sua obra-prima (não se enganou).

As filmagens ocuparam 165 dias.

Terminada a principal photography, Cimino ainda recebeu mais 3 milhões de Dólares para filmar o prólogo e o epílogo. Mas o estúdio deu-lhe um ultimato – não havia mais gastos e os prazos eram cumpridos. Cimino chegou a pedir 5.2 milhões de Dólares.

Filmaram-se mais de 400.000 metros de película, num total de 220 horas de metragem.

As filmagens terminam em Março de 1980.

O objectivo era estrear o filme em Dezembro… de 1979.

O orçamento já ia em 30 milhões de Dólares.

Momentos

O evento que Cimino conta no filme ocorreu mesmo. Foi no Wyoming, em 1892, com barões do gado a contratar mercenários para matarem imigrantes agricultores da região. Nomes e eventos foram de mudanças para favorecer o argumento.

James Averill, Nathan Champion e Ella Watson são personagens verídicos.

O prólogo passa-se em Harvard, mas foi filmado em Oxford, dado que Harvard recusou filmagens locais.

Os poemas citados em Harvard são de Charles Edward Grinnell, Frank Sumner Wheeler, James Holden Young e Andrew Peabody.

A personagem de Isabelle Huppert chama-se “Ella”. Em 2016, Huppert é protagonista de um filme chamado “Elle”.

A locomotiva teve de ser transportada de Denver, Colorado. Foi necessário fazer ajustes na linha ferroviária, pois a locomotiva não se ajustava.

O nevoeiro é criado por máquinas próprias.

O momento em que Kris Kristofferson acorda de ressaca e usa o chicote demorou 52 takes e todo um dia de filmagens. Tudo por um par de segundos de metragem.

O patinador a tocar violino é David Mansfield, o autor da música do filme.

Tripas de cavalos foram usadas nas cenas gore.

O filme também ficou famoso por actos de crueldade para com animais – lutas de galos, galinhas decapitadas, cavalos sujeitos a enormes esforços (quatro morreram devido a tal), cavalos que explodiram. O caos era tal que o Screen Actors Guild e The Alliance of Motion Picture & Television Producers decidiram mudar as regras e contratar a American Humane Society sempre que um filme recorria a animais.

No primeiro cut, a batalha final tinha a duração média de uma longa-metragem.

Estreia, efeitos e consequências

Cimino contratou segurança em regime 24/7 para proteger a sala de montagem. Cimino não queria interferências nem intromissões e nunca permitiu que o estúdio acompanhasse o processo de montagem.

Cerca de 220 horas de footage foram filmadas.

Em Junho de 1980, Cimino mostra ao estúdio o seu primeiro cut – 5 horas e 20 minutos. Cimino chegou a dizer que este cut tinha mais 15 minutos do que o final cut.

O estúdio não gosta de tamanha duração. Cimino promete reeditar o filme. E assim acontece ao longo do Verão. O filme passa para 3 horas e 39 minutos.

Ainda antes de estar editado, o filme já era alvo de troça na imprensa. Havia quem o intitulasse de “Apocalypse Next”.

 

Era, na época, o filme mais caro de sempre.

A premiere em Nova Iorque foi um desastre.

Depois das desastrosas premieres, Cimino pediu à United Artists tempo para fazer um novo cut.

 

A estreia passa para Novembro de 1980.

As primeiras reacções são desastrosas (de público e crítica) e o estúdio retira o filme das salas. Reedita-o (com 149 minutos – sem qualquer acção de Cimino) e estreia esse cut em Abril de 1981.

Mas já vai tarde. A desgraça está feita, a má reputação criada – o filme é um flop gigantesco, com as bilheteiras a arrecadarem menos de 10% do orçamento. De filme mais caro de sempre, “Heaven`s Gate” é também o maior flop de sempre.

O filme levou a United Artists à ruína e ela foi comprada pela MGM. A United Artists ainda beneficiou nesse ano do sucesso de “007 – For Your Eyes Only”, mas não foi suficiente para evitar a falência. O estúdio dedicou-se desde então a filmes comerciais, evitando filmes artísticos.

A United Artists ainda ganhava bom dinheiro com as sagas “James Bond”, “The Pink Panther” e “Rocky”.

Com a compra da United Artists pela MGM, funda-se a MGM/UA Entertainment Co..

Nos dias de hoje, o custo de “Heaven’s Gate” seria o equivalente a 150 milhões de Dólares (ainda assim, menos que muitos títulos da Marvel e de James Cameron).

Se o filme fosse um sucesso, o filme seguinte de Cimino seria “Conquering Horse”, a partir do romance de Frederick Manfred, sobre a saga dos Sioux nos USA. O filme seria todo falado na língua desses nativos. O projecto nunca avançou.

Cimino ficou sem trabalho por cinco anos. Regressou em 1985 com o intenso “Year of the Dragon”, um dos melhores policiais da década (e de sempre).

Michael Cimino e Kris Kristofferson planeavam fazer uma nova versão de “The Fountainhead” (1949, de King Vidor, com Gary Cooper). Um projecto seria igualmente pessoal para Cimino, pois era sobre arquitectura e Cimino tinha formação na área. Com o flop de “Heaven`s Gate”, tudo ficou cancelado. O projecto anda agora ligado a Zack Snyder.

Quando estreou em França, vários críticos compararam Cimino a Orson Welles e Erich von Stroheim. Houve quem chamasse a Cimino “O Lev Tolstoy da câmara”.

França foi um dos poucos países a ver o cut integral do filme. O filme foi um sucesso de público e crítica no país.

 

“Heaven’s Gate” junta-se a um par de complicadas produções da época (ainda que resultassem em grandes filmes) como “Sorcerer” (1977, de William Friedkin, 1941 (1979, de Steven Spielberg), “Reds” (1981, de Warren Beatty).

“Heaven`s Gate” junta-se a uma série de westerns da época que falharam nas bilheteiras – “Goin’ South” (1978), “Cactus Jack” (1979), “The Frisco Kid” (1979), “The Mountain Men” (1980), “The Legend of the Lone Ranger” (1981), “Hard Country” (1981), “Cattle Annie and Little Britches” (1981), “Barbarosa” (1982).

O Western ficaria de fora de Hollywood por uns anos, até regressar com “Silverado” (1985), “Rustlers’ Rhapsody” (1985), “Pale Rider” (1985), “Lust in the Dust” (1984). Só “Pale Rider” triunfou nas bilheteiras.

A mini-série “Johnson County War” (2002) aborda o mesmo evento que “Heaven`s Gate”.

 

Na época o filme foi um bombo de festa, sendo considerado um dos piores filmes de sempre.

O filme causou mudanças na indústria – os estúdios deixaram de entregar controlo total aos realizadores, ficando os estúdios com esse controlo. Aqui e ali foram surgindo excepções (os filmes de John Carpenter, Martin Scorsese, Steven Spielberg, Robert Zemeckis, Oliver Stone, Tim Burton, James Cameron).

Durante a promoção de “Desperate Hours” (1990), Cimino assumiu toda a responsabilidade pelo desaire de “Heaven`s Gate”.

Michael Cimino junta-se a um conjunto de jovens realizadores que tiveram sucesso mas problemas com alguns filmes, face aos orçamentos e à complexidade de produção – Francis Ford Coppola (“Apocalypse Now”, “One From The Heart”), Martin Scorsese (“New York, New York”), Peter Bogdanovich (“Daisy Miller”), William Friedkin (“Sorcerer”, “Cruising”), Warren Beatty (“Reds”), Steven Spielberg (“1941”). Casos de liberdade total dada a cineastas, com grandes dano$ causados aos estúdio.

 

Tom Noonan considera que teve aqui uma das suas piores experiências de carreira. Afirmou que Cimino abusava dos actores e da equipa, com fortes tiques autoritários.

Jeff Bridges ficou com uma das cabanas. Tem-na no Montana, que usa como refúgio em família.

Bridges é grande fã do filme e gosta cada vez mais por cada vez que revê o filme.

Kris Kristofferson tem grande orgulho no filme. Mas o flop dele destruiu a sua carreira cinematográfica. O actor viu-se relegado para filmes de segunda e como secundário, voltando a dar ênfase à sua carreira como cantor.

Martin Scorsese considera que o filme é subestimado.

“Final Cut” é livro de Steven Bach, que ilustra todo o processo de produção de “Heaven`s Gate”.

Em 1999, a “Time” chega a colocar “Heaven`s Gate” como uma das ”100 Worst Ideas of the 20th Century”.

Em 2011, a “Time Out London” considera “Heaven’s Gate” como o 12º melhor Western de sempre.

A BBC considera “Heaven`s Gate” como um dos “100 Greatest American Films of All Time”.

Os diversos Cuts:

  • Workprint – 325 minutos
  • Para os studio executives e Premiere – 219 minutos
  • Estreia (Director’s Second edit) em 1981 – 149 minutos
  • Lançamento em 1981 nalguns países europeus – 219 minutos
  • Special screening em Paris e Nova Iorque em 2005 (o restored Director’s Cut) – 216 minutos

 

A versão de 149 minutos omite imensas cenas fulcrais:

  • O discurso de Irvine na festa de graduação em Harvard.
  • O baile após a festa.
  • Averill a bater-se com o durão da rua.
  • Averill preocuado com uma senhora.
  • A luta entre dois imigrantes.
  • O baile em patins.
  • As mulheres a transportarem carga pela colina.
  • Champion a quase matar um agricultor por ter insultado Ella.
  • Quando Ella deixa Champion para ir ter Averill.
  • Quando Averill lê a lista das pessas a abater.
  • Averill à conversa com Bridges sobre o envelhecimento.
  • Os imigrantes a saberem que Averill deixou o cargo.
  • Ella a avisar os agricultores que os criadores de gado chegaram.
  • Minutos finais da batalha final, onde se vê um personagem a ser esmagado por uma carroça e uma mulher a abatê-lo.
  • Uma mulher a suicidar-se.
  • Bridges e Averill a verem os resultados da batalha.
  • Planos da mulher no barco, no final.

 

Vários e longos momentos, que ao ficarem de fora criam alguma ilógica, precipitação e falta de coerência entre cenas no cut mais curto. E assim se justifica muita crítica face à incoerência desse cut.

Apesar do primeiro cut ser de 5 horas e 25 minutos, o primeiro Director`s Cut é de 3 horas e 39 minutos. O cut inicial está perdido.

Em 2005 surge a radical version, editada pelo historiador da MGM John Kirk, com 219 minutos. Foi mostrada em Paris e no New York’s Museum of Modern Art. Isabelle Huppert fez a apresentação. Surgiram planos para a sua edição para o mercado doméstico, mas nunca aconteceu.

Em 2012 surge o digitally restored Director’s Cut, com 216 minutos, mostrado em Veneza.

A “Criterion Collection” lança esse cut em Novembro de 2012. a edição conta com a supervisão de Michael Cimino. Cimino diz que este é o seu cut preferido e o que traduz a sua visão.

 

Só quando o Director`s Cut é mostrado em Cannes é que o filme começa a ser alvo de uma (profunda) reavaliação e revalorização.

Em 2012, o Director’s Cut é mostrado em Veneza e surge uma aclamação total.

A passagem do tempo tem dado culto ao filme. A visão do Director`s Cut permitiu uma reavaliação e revalorização.

 

Sobre as Johnson County Wars

https://www.wyohistory.org/encyclopedia/johnson-county-war-1892-invasion-northern-wyoming

http://www.wyomingtalesandtrails.com/johnson.html

 

Sobre “Heaven`s Gate”

https://www.denofgeek.com/movies/10-stories-of-excess-from-the-production-of-heavens-gate/

 

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