Título original – The Running Man
Arnold Schwarzenegger era um tremendo action hero, mas com forte ênfase na sci-fi (“The Terminator”, “Predator”).
Ei-lo de volta a tal género.
Futuro. Ano 2017.
“The Running Man” é um popular reality show onde presidiários são “convidados” a participar numa corrida de sobrevivência a uma série de caçadores (todos com armamentos bem incríveis). Se vencerem, obtêm a liberdade.
Ben Richards, ex-polícia, é o mais recente concorrente. Richards vai dar luta, descobrir toda a manipulação que existe no jogo e mudar as coisas.
Como se espera da boa sci-fi, há um contexto social, político, tecnológico e humano como fundo.
O filme faz ilustração de um futuro onde a Televisão domina, os reality shows controlam a mentalidade social, há fake news constantes e impera o caos financeiro.
(hmmm, sci-fi ou documentário actual?)
Resulta interessante a ideia do jogo ser uma espécie de arena romana moderna e ter a devida cumplicidade governativa/política (tal já tinha sido abordado, mas com mais profundidade e sem relegar o espectáculo actioner, em “Rollerball” – 1975, de Norman Jewison).
O filme consegue alguma abordagem aos temas e ideias propostas, mas fica-se por uma grande ligeireza.
O resultado acaba por ser mesmo um actioner survival à volta de um jogo onde tudo vale, tanto para protagonistas como adversários.
Faltou uma melhor visualização daquele mundo futurista (há aqui potencial para algo ao nível de “Escape from New York”, “Blade Runner”, “RoboCop”), poder de incómodo e perturbação (as ideias do argumento convidam à reflexão – bom, tendo em conta o estado de algumas coisas do mundo moderno, que até já foram “previstas” na sci-fi, é caso para se dizer que ninguém reflecte sobre as parábolas da boa sci-fi) e uma encenação mais violenta dos eventos.
Boa fotografia.
Arnold Schwarzenegger está em boa forma como action hero, mas algo perdido em termos de representação (pois, Arnie precisa de boa direcção nessa área) face ao que se viu em “The Terminator”, “Commando” e “Predator”. Felizmente que se diverte com as suas (divertidas) crispadas lines.
Richard Dawson mete o filme no bolso, com a sua ironia maléfica e manipuladora.
Paul Michael Glaser vinha da Televisão (era o Hutch da popular e influente “Starsky & Hutch”; passou depois para a realização) e isso nota-se. Bom ritmo, sim; directo ao assunto, sim; ilustração eficaz, sim; mas não consegue o poder de espectáculo, de acção e da profundidade das ideias presentes.
O filme pede Paul Verhoven a todo o momento (o cineasta holandês tinha feito nesse ano o imponente “RoboCop”, voltaria a fazer grande sci-fi crítico-analítica com “Starship Troopers” e trabalharia com Schwarzenegger em “Total Recall” – todos os títulos são obras-primas e clássicos do género e conseguiram ser reflexões sobre muita coisa, mas sempre com pé pesado na acção e no espectáculo, sempre incómodos na abordagem da violência).
É um título a precisar de remake (para melhor).
Ainda assim, fica um bom entretenimento através de um actioner escorreito, com ideias inteligentes, pertinentes e mais actuais do que nunca.
Recomendável.
“The Running Man” não tem edição portuguesa. Existe noutros mercados, a bom preço.
Realizador: Paul Michael Glaser
Argumentista: Steven E. de Souza, a partir do romance de Stephen King (escrito como Richard Bachman)
Elenco: Arnold Schwarzenegger, Maria Conchita Alonso, Richard Dawson, Yaphet Kotto, Jim Brown, Jesse Ventura, Erland van Lidth, Marvin J. McIntyre, Gus Rethwisch, Professor Toru Tanaka, Mick Fleetwood, Karen Leigh Hopkins, Sven-Ole Thorsen
Trailer
Clips
A banda sonora de Harold Faltermeyer
Arnold Schwarzenegger sobre “The Running Man”
Orçamento – 27 milhões de Dólares
Bilheteira – 38 milhões de Dólares
“Melhor Actor Secundário” (Richard Dawson), nos Saturn 1988. Esteve nomeado para “Melhor Filme – Ficção Científica”, mas perdeu para “RoboCop”.
Quando Rob Cohen (produtor do filme) comprou os direitos sobre o livro “The Running Man”, ele não fazia ideia que Richard Bachman era um pseudónimo de Stephen King.
O produtor George Linder vendeu a sua companhia, Quadra Wheelchairs, para financiar o filme.
Dolph Lundgren e Christopher Reeve mostraram interesse em protagonizar o filme.
Patrick Swayze foi ponderado como protagonista.
Don Johnson chegou a ser finalista na escolha do protagonista, mas preferiu recusar para continuar com os seus deveres em “Miami Vice” (então a caminho da Season 3).
Richard Dawson foi uma escolha da casting director Jackie Burch (irmã de Cohen). Dawson ganhou popularidade ao apresentar o concurso “Family Feud” (1976). Segundo colegas, Dawson tinha muitas semelhanças com o seu personagem Damon Killian.
Alex Cox mostrou interesse em realizar o filme, mas estava ocupado com “Walker” (1987).
Cohen passou por uma saga até ter realizador definitivo:
- George Pan Cosmatos foi o primeiro a ser considerado (Cohen gostou do seu trabalho em “Rambo: First Blood – Part II”, em 1985). Mas Cosmatos queria localizar o filme dentro de um centro comercial, pelo que Cohen o rejeitou (achou que Cosmatos se estava a desviar do tom do filme).
- Carl Schenkel (“Out of Order”/”Downwards”, em 1984) foi então sondado, mas ele rejeitou pois não se sentia à vontade com um grande orçamento.
- Ferdinand Fairfax (“Nate and Hayes”, em 1983) foi chamado, mas levou o projecto para áreas que Cohen não gostou.
- Andrew Davis (“Code of Silence”, em 1986, com Chuck Norris) foi chamado. Davis chegou a avançar com o projecto, mas ao fim de 8 dias de filmagens, já o filme ia com 8 milhões de Dólares acima do orçamento e com 4 dias de atraso.
- Cohen vira-se então para Paul Michael Glaser, que já conhecia da Televisão, pois ambos tinha trabalhado em “Miami Vice” (1984-1989). Glaser foi chamado à última da hora.
O filme junta quatro actores vistos na saga “Predator” – Arnold Schwarzenegger, Jesse Ventura e Sven-Ole Thorsen aparecem em “Predator” (1987); Maria Conchita Alonso entraria em “Predator 2” (1990).
Primeiro filme de Mick Fleetwood, líder dos emblemáticos Fleetwood Mac.
O filme passa-se de 2017 a 2019.
A footage do ataque dos helicópteros vem de “King Kong” (1976).
O prédio da estação de televisão é o Filmland Corporate Center, em Los Angeles, na época a sede da Metro-Goldwyn-Mayer.
O carro que leva Killian aos estúdios é um Maserati Quattroporte III.
ICS é a companhia ligada aos eventos do filme; é também o nome da companhia que desenvolve a Skynet em “Terminator 3 – Rise of the Machines” (2003). Arnold Schwarzenegger também protagonizaria esse filme.
A dança no início do concurso foi coreografada por Paula Abdul. Abdul recorre a dançarinas que eram amigas suas desde o grupo Laker Girls.
Num momento, mostra-se no escritório de Killian um poster de uma série televisiva chamada “Hate Boat”. Dawson participou num episódio da popular série “The Love Boat” (1977-1987).
Quando Ben Richards foge da prisão e corre, é um stand-in que interpreta o personagem de Schwarzenegger. O mesmo stand-in está em cena quando Richards está a ser perseguido na pista do aeroporto. Nas duas situações, não se mostra o rosto de Richards/ Schwarzenegger.
Schwarzenegger diz a sua habitual line “I’ll be back!“.
Body Count – 41.
O filme ia estrear em Julho de 1987, mas foi adiado para não competir com outro filme de Arnold Schwarzenegger, “Predator”.
Arnold Schwarzenegger não gostou da escolha de Paul Michael Glaser como realizador. Achou que Glaser realizou mais como um telefilme e não soube explorar todas as potencialidades, visuais e narrativas, do argumento.
É o último filme de Richard Dawson e Erland van Lidth.
Os personagens de Arnold Schwarzenegger e Richard Dawson são inimigos, mas os dois são grandes amigos na vida real.
O filme já antecipa a mudança facial por efeitos digitais.
Quando Arnold Schwarzenegger concorreu a Governador da California, ele usou um autocarro que tinha a designação… “The Running Man”.
O filme conta com dois actores que se tornariam Governadores – em Novembro de 1998, Jesse Ventura é eleito Governador do Minnesota; em Outubro de 2003, Arnold Schwarzenegger é eleito Governador da California.
O jogo “The Running Man” inspira-se num jogo japonês, “Trans American Ultra Quiz” – os concorrentes eram gozados, humilhados e torturados até ao limite; ganhava quem aguentasse mais.
O filme inspirou o reality survival show “American Gladiators” (1989).
Em 1989 foi lançado um video game inspirado pelo filme, apto para MSX, ZX Spectrum, Commodore 64, Amstrad CPC, Amiga e Atari ST. Foi criado pela Emerald Software e Grandslam Entertainments.
Em 1990 sai o video game “Smash TV”, que também se inspira em “The Running Man”.
A ideia de Cosmatos em localizar a acção num centro comercial inspirou um jogo – “Manhunt” (2003), que mostra um presidiário em luta contra gangs em diferentes ambientes, sendo um deles um centro comercial.
Parte do conceito narrativo seria inspiração para a saga literária “The Hunger Games” (que depois seria alvo de uma saga cinematográfica protagonizada por Jennifer Lawrence).
Arnold Schwarzenegger seria ponderado para “Fortress” (1992), também sobre a sobrevivência e fuga de um presidiário. Também se passava em 2017. Christopher Lambert protagonizaria esse filme.
Em 2017, um jornalista da BBC mostrou como o filme antecipa e acerta nalgumas coisas que já eram realidade nesse tempo (e que continuam actuais) – o colapso financeiro de países, os reality shows, o poder manipulador dos media, as fake news.
Sobre Richard Bachman:
https://www.stephenking.com/library/bachman_novel/