Título original – Edge of Darkness
A divulgação do trailer do novo filme de Mel Gibson (como realizador) é um bom motivo para se rever o filme que marcou o seu regresso ao activo (como actor).
Gibson tinha feito uma pausa na interpretação depois de “Signs” (2002, de M. Night Shyamalan, que se revelou um grande sucesso nas bilheteiras – o maior de Gibson e um dos maiores de Shyamalan – e uma das melhores interpretações do actor).
O seu regresso foi com este trepidante “Edge of Darkness”.
Gibson regressa a um género de cinema que domina (o thriller policial) e a um tipo de personagens que faz de olhos fechados (violentos, à beira do limite, emotivos, homens de família).
Thomas Craven é um veterano polícia de Boston, da área dos Homicídios, com um curriculum impoluto.
A visita da sua filha, com quem tem um relacionamento distante, poderia marcar um sinal de reconciliação.
Na noite do regresso, Emma é assassinada. Craven acredita que o alvo era ele, inicia uma investigação e uma cruzada vingativa.
A investigação revela-lhe pormenores da vida de Emma, que Craven nunca imaginou. Para além disso, Craven descobre uma conspiração que envolve o governo e interesses de corporações privadas.
Se outro mérito não tivesse, “Edge of Darkness” seria registado pelo regresso à representação de Mel Gibson, ao fim de oito anos.
Mas não faltam motivos de celebração com este intenso “Edge of Darkness”.
Historia de laços e segredos, mistérios e conspirações, justiça e vingança, é a jornada de um homem solitário em busca de respostas sobre a perda de única pessoa que ainda o prendia à vida.
É um conto sobre segredos de filha para pai, agendas escondidas de organizações e governos, relações dúbias entre corporações e política, o peso da memória sobre o ente querido perdido, a dor do desconhecimento sobre a verdade.
É, acima de tudo, uma história de amor de um pai pela filha, bem como o poder da memória de tal como apego à vida e com força além da morte.
Há espaço para um “debate” entre dois homens sobre verdade, lei & ordem e certos “estados da nação”.
Mel Gibson regressa em grande, com aquela que considero a sua melhor interpretação de sempre (vejam-se os diversos momentos em que ele salta da dor para a raiva, o calor paternal com a filha em contraste com a brutalidade quando se confronta com os seus inimigos) – perfeitamente ao nível das de “Mad Max”, “Lethal Weapon”, “Braveheart”, “Ransom”, “The Patriot”.
Martin Campbell (a passar por um bom momento de forma, depois do excelente “Casino Royale” – provavelmente, o melhor filme da saga 007) realiza de forma muito competente (ao ver o filme senti-me como se estivesse a ver os grandes filmes do género, feitos nos 70`s pelo grande Don Siegel), com excelente sentido de ritmo (embora muito “fora de moda”, pois é suave, ainda que tenso, e não uma alucinada sucessão de planos e imagens que só confundem o espectador; a montagem é do sempre competente Stuart Baird), sabendo equilibrar entre o emocional (os momentos entre Thomas & Emma), o espectacular (a cena do “atropelamento” e o que se segue) e o violento (a morte de Emma é de um tremendo impacto; a confrontação final entre Craven e os seus inimigos é brutal).
Bom trabalho do restante elenco (Ry Winstone inquieta pois sabe-se que vai explodir a qualquer momento, Danny Huston irrita pela sua altivez, Bojana Novakovic cativa pela sua candura).
Howard Shore (habitual compositor de David Cronenberg) cria um score emotivo, violento e sentimental.
Óptima fotografia do grande Phil Meheux.
O argumento (no qual anda William Monahan, o autor de “The Departed”, de Martin Scorsese), apesar de se mover por áreas já muitas vezes exploradas em cinema, é robusto, bem estruturado e sabe dar espaço aos personagens, à lógica da progressão dos eventos e àquilo que se chama de action.
Recomendo a (re)descoberta da série televisiva. O filme faz-lhe uma excelente homenagem (algo que já tinha acontecido no ano anterior com “State of Play” – um excelente thriller jornalístico, a partir de uma excelente série televisiva). Onde quer que esteja, Troy Kennedy Martin (autor da série televisiva, falecido em 2009; é um dos mais importantes argumentistas dos 70`s em matéria de policiais – é dele a referencial série “The Sweeney”) estará orgulhoso desta excelente adaptação cinematográfica.
Um excelente thriller policial.
Um magnífico comeback de Mel Gibson (a mostrar, mais uma vez, que merece estar entre os maiores actores de sempre).
Foi um dos melhores filmes de 2010.
Obrigatório.
“Edge of Darkness” tem edição portuguesa e está a preço bem controlado.
Realizador: Martin Campbell
Argumentistas: William Monahan, Andrew Bovell, a partir da série televisiva criada por Troy Kennedy-Martin
Elenco: Mel Gibson, Ray Winstone, Danny Huston, Bojana Novakovic, Jay O. Sanders, Frank Grillo
Site – http://www.warnerbros.com/edge-darkness
Orçamento – 80 milhões de Dólares
Bilheteira – 43 milhões de Dólares (USA); 81 (mundial)
É o filme que marca o regresso de Mel Gibson como actor, após uma pausa de oito anos.
O filme é baseado numa série televisiva, de 1985, com o mesmo título, protagonizada por Bob Peck. Foi um enorme sucesso (público e crítico), ganhou imensos prémios (BAFTA para “Melhor Série Dramática” e “Melhor Actor”) e goza hoje de algum estatuto de culto. Foi realizada pelo próprio Martin Campbell, que sempre sonhou em levá-la ao grande ecran. Gibson sempre foi grande fan da série e esta adaptação foi um bom motivo para o seu regresso à frente das câmaras.
Ray Winstone substituiu Robert De Niro, que abandonou o set no início de filmagens, devido a conflitos criativos com Campbell.
John Corigliano era o compositor inicial. O seu score foi rejeitado quando a refilmagem de várias cenas tornou o filme mais actioner. Corigliano não se mostrou interessado em criar um novo score (achou que o filme final não era aquele para o qual tinha sido chamado), pelo que Howard Shore foi convocado.
Adrian Grunberg é assistant director na second unit. Grunberg tinha sido assistant director para Mel Gibson em “Apocalypto” (2006) e iria dirigi-lo em “Get the Gringo” (2012).
Joe Don Baker, co-protagonista da série original e amigo de Martin Campbell (realizador do filme e da série) manifestou-se contra o filme, pois achava que numa metragem tão “curta” não seria possível desenvolver, com detalhe e profundidade, os eventos e os personagens como na duração de uma (mini-)série.
A cena final foi delineada por Mel Gibson.
O filme é dedicado a Troy Kennedy Martin (o criador da série em que o filme se baseia, falecido em 2009).
Sobre a série televisiva
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