Título Original – The Departed
Perante a popularidade da saga “Infernal Affairs” (já aqui vista), seria uma questão de tempo até Hollywood fazer um remake.
Ei-lo.
Vem pela mão de Martin Scorsese e traz um elenco de luxo.
E até Oscars.
Boston. A luta entre a Policia e a Máfia Irlandesa está ao rubro.
Mas as duas organizações têm trunfos – um infiltrado em cada.
Quando cada um dos infiltrados sabe da existência do outro, inicia-se um perigoso jogo de gato e rato.
“The Departed” faz uma correcta adaptação de “Infernal Affairs” às regras de Hollywood, à mentalidade americana, à cidade de Boston e ao mundo irlandês.
Entre o cop film sobre infiltrados e o gangster film à Scorsese, fala-se de ratos e homens.
Crónica policial sobre identidades (verdadeiras e falsas) e a procura da afirmação delas, “The Departed” é também uma odisseia trágica sobre paternidades malditas (o mafioso tenta ser um “pai” para os dois infiltrados) e filhos perdidos (os dois infiltrados são pessoas à margem, em busca de alguém a quem dar algo).
O elenco é portentoso, mas não está lá apenas para dar nome ou prestígio. Todos dão “festival”, particularmente Leonardo DiCaprio (comovente), Matt Damon (repulsivo) e Jack Nicholson (diabólico).
Scorsese dirige com mestria, fiel ao seu estilo (duro, violento, “másculo”, desencantado), e atento ao ritmo (que nunca decai ao longo de quase duas horas e meia).
Um grande cop & gangster film.
Um dos grandes momentos de Scorsese.
Mas…
“The Departed” é um remake.
Merece ser avaliado como filme autónomo, mas também tem de o ser face ao original.
Vejamos as diferenças, semelhanças e qual supera qual:
- Scorsese precisa de quase mais uma hora para contar a história face ao que conseguiram Andrew Lau e Alan Mak. “Infernal Affairs” tem melhor ritmo (e não é atabalhoado), segue uma lógica de get to the point, dando atenção ao que e a quem é necessário, sem perder solidez no argumento, na densidade dos personagens e eventos.
- O argumento do remake mete mais personagens em cena (alguns que são vindos das sequelas da saga original), pelo que, obviamente, tem de haver mais “tempo de antena” para todos eles e para que se tornem relevantes.
- O interesse feminino é comum no remake (no original, cada um tinha a sua menina), o que permite um triângulo amoroso muito interessante e deixa a personagem em dilemas.
- No remake, o destino dos protagonistas é diferente do que é dado no filme original. O filme de Lau & Mak acaba por ser mais “optimista” (face a um personagem) e “religioso” (fala sobre o inferno e o destino). O de Scorsese é mais desencantado e trágico.
Em suma:
“The Departed” é um excelente título do género, bem inserido no estilo de Cinema de Scorsese. Traz muitas e boas adendas no argumento, mais metragem, mais personagens, mais eventos, relações e emoções. Mas tal não é, forçosamente, uma prova de que é melhor que “Infernal Affairs”. Mais rico e denso, sim, mas não necessariamente melhor.
“Infernal Affairs” é mais “arrumadinho”, directo, com a duração certa, com a devida “filosofia oriental” sobre Vida, Morte, Destino, Castigo e Inferno.
“The Departed” é um excelente remake, de grande nível (Scorsese já tinha feito algo assim – “Cape Fear”, remake do clássico dos 60s com o mesmo título).
Mas…
“Apenas” iguala a excelência de “Infernal Affairs”.
No fundo, e aqui e ali com a mesma semelhança, são dois magníficos filmes que contam a “mesma” história, mas de formas diferentes (e brilhantes).
Mas é de esperar que muita gente prefira o filme de Scorsese face ao de Lau & Mak – a presença de Scorsese, o seu (fantástico) elenco, os prémios (algo que “Infernal Affairs” também ganhou) e, claro, os Oscars.
“The Departed” tem edição portuguesa (com um ou dois discos) e anda a preço “marginal”.
Realizador: Martin Scorsese
Argumentista: William Monahan, a partir de um argumento de Alan Mak e Felix Chong
Elenco: Leonardo DiCaprio, Matt Damon, Jack Nicholson, Mark Wahlberg, Martin Sheen, Ray Winstone, Vera Farmiga, Alec Baldwin, James Badge Dale
Orçamento – 90 milhões de Dólares
Bilheteira – 132 (USA); 289 (mundial)
Site – http://www.tfmdistribution.com/thedeparted/
Trailer –
“Melhor Filme”, “Melhor Realização”, “Melhor Montagem”, “Melhor Argumento Adaptado”, nos Oscars 2007.
“Melhor Realização”, nos Globos de Ouro 2007.
“Melhor Actor” (Leonardo DiCaprio), “Melhor Actor Secundário” (Jack Nicholson), pelos críticos de Austin 2007.
“Melhor Filme”, “Melhor Realização”, “Melhor Argumento”, “Melhor Actor Secundário” (Mark Wahlberg), pelos críticos de Boston 2006.
“Melhor Actor” (Leonardo DiCaprio), “Melhor Realização”, “Melhor Argumento Adaptado”, “Melhor Elenco”, pelos críticos de Ohio 2007.
“Melhor Filme”, “Melhor Realização”, “Melhor Argumento Adaptado”, pelos críticos de Chicago 2006.
“Melhor Realização”, pelo Directors Guild of America 2007, pelos críticos de Dallas 2006, pelos críticos de Iowa 2007, pelos críticos de Nova Iorque 2006, pelos críticos do Texas 2006, pelos críticos de Oklahoma 2006, pelos críticos de Washington 2006.
“Melhor Realização”, “Melhor Actor” (Leonardo DiCaprio), “Melhor Actor Secundário” (Jack Nicholson), pelos críticos de Dublin 2006.
“Melhor Argumento”, nos Prémios Edgar Allan Poe 2007, pelos críticos de Kansas City 2006.
“Melhor Thriller”, nos Prémios Empire 2007.
“Melhor Filme”, “Melhor Realização”, “Melhor Actor Secundário” (Jack Nicholson), “Melhor Argumento”, pelos críticos da Florida 2006.
“Melhor Filme”, “Melhor Realização”, “Melhor Montagem”, pelos críticos de Las Vegas 2006.
“Melhor Vilão” (Jack Nicholson), nos Prémios MTV Movie 2007.
“Melhor Elenco”, pela National Board of Review 2006.
“Melhor Filme – Drama”, “Melhor Actor Secundário” (Leonardo DiCaprio), “Melhor Argumento Adaptado”, “Melhor Elenco”, nos Prémios Satellite 2006.
“Melhor Filme”, “Melhor Realização”, pelos críticos de St. Louis 2006.
“Melhor Argumento Adaptado”, pelo Writers Guild of America 2007.
Scorsese não quis ver o filme original, para que tal não interferisse nas suas decisões criativas.
Scorsese quis com este filme prestar a sua homenagem a grandes mestres do thriller policial como Robert Aldrich, Samuel Fuller e Don Siegel.
Brad Pitt (produtor do filme) ia participar, mas desistiu para fazer “Babel”. Matt Damon substituiu-o.
Inicialmente, o projecto era que os protagonistas fossem Pitt e Tom Cruise.
Ray Liotta (protagonista de “Goodfellas”, também de Scorsese) ia participar, mas teve de recusar por conflitos de agenda. Mark Wahlberg substituiu-o.
Wahlberg baseou a sua interpretação em polícias que conheceu na sua adolescência delinquente.
Ethan Hawke foi considerado para o personagem de Wahlberg.
Denis Leary também foi considerado para o mesmo personagem, mas teve de recusar por conflitos de agenda.
Alec Baldwin (que tinha trabalhado com Scorsese em “The Aviator” e tinham-se entendido tão bem, que ficou prometida uma nova colaboração) foi escolhido devido à recusa de Mel Gibson (então ocupado com “Apocalypto”).
Leonardo DiCaprio recusou fazer “The Good Shepherd” para estar neste filme de Scorsese. Matt Damon foi eleito como substituto.
Robert De Niro recusou o personagem que iria para Martin Sheen, pois ia participar e realizar “The Good Shepherd”.
Damon chegou a acompanhar polícias de Boston, para estudar comportamentos.
Inicialmente, Jack Nicholson rejeitou participar, mas depois mudou de ideias ao conversar com Scorsese, Monahan e DiCaprio. Nicholson achava que o seu personagem era uma encarnação do Mal. Nicholson improvisou em muitas cenas do filme.
A cena em que Nicholson atira cocaína às prostitutas foi uma ideia do actor.
Ray Winstone e Nicholson não se deram bem.
Vera Farmiga compõe uma personagem que é uma mistura de duas no filme original.
Scorsese queria actrizes mais conhecidas como Kate Winslet, Emily Blunt ou Hilary Swank, mas depois optou por Farmiga, menos conhecida.
Muitos dos personagens que morrem são, nalguns momentos, mostrados com um X em background. É um artifício que Scorsese recolheu de Howard Hawks em “Scarface”.
Scorsese queria filmar em Boston, mas devido aos impostos da cidade, Nova Iorque foi eleita. Ainda assim, houve alguma metragem filmada em Boston.
Uma semana antes da estreia, Scorsese ainda fez ajustes na montagem final.
Scorsese considerou que este era o seu primeiro filme com uma intriga.
É a terceira vez que Martin Scorsese usa a canção “Gimme Shelter” dos The Rolling Stones, depois de “Goodfellas” e “Casino”.
Até “The Wolf of Wall Street”, era o maior sucesso comercial da carreira de Scorsese.
O filme ia ser uma produção low budget, mas a chegada constante de grandes nomes elevou o orçamento.
Os direitos para fazer um remake foram comprados pela Warner em 2003 pelo custo de 1.75 milhões de Dólares.
Foi o primeiro filme a ser oscarizado como “Melhor Filme” a não ter edição em VHS, sendo o primeiro de tal categoria a ser editado em HD-DVD.
Thomas B. Duffy era o consultor do filme. Duffy é um agente da Polícia de Boston, já reformado. Especialista no combate ao crime organizado, Duffy combateu um rei do crime chamado James ‘Whitey’ Bulger (que inspira o personagem de Nicholson). Duffy faz um cameo – é o Governador na festa de graduação dos cadetes da Polícia.
Até então, era o único remake a ser “Melhor Filme” nos Oscars.
À semelhança do que aconteceu com “Infernal Affairs”, também se planearam duas sequelas. Um até seria (tal como aconteceu na saga “Infernal Affairs”) uma prequela (um “The Departed II”) e o outro seria uma sequela (um “The Departed III”). Na prequela, e tal como no original, abordaria-se os primeiros tempos dos protagonistas. A sequela mostraria, tal com no original, um dos agentes sobreviventes a enfrentar uma nova organização e um novo infiltrado. Para um deles até se falou nas presenças de Robert De Niro (que assim regressaria ao cinema de Scorsese) e Al Pacino – ambos em lados opostos da Lei, como já tinha acontecido em “Heat”, mas agora com os papéis invertidos.
Andrew Lau, co-realizador do filme original, afirmou ter gostado do remake (classifica-o com 8/10), mas prefere o seu filme. Lau considera que o filme faz uma correcta adaptação à cultura americana, mas que o argumento combina os elementos dos três filmes originais, criticando a forma como se combinou numa só personagem (a de Farmiga) duas que vinham do filme original.
A comparação entre “Infernal Affairs” e “The Departed”