Título Original – The Lady Vanishes
É um dos filmes finais de Hitchcock no seu Período Britânico.
E é (com toda a justiça) um dos seus títulos mais aclamados, populares e melhores.
Uma verdadeira lição de cinema de entretenimento, com (grande) estilo.
Europa de Leste, numa pequena povoação.
Iris Henderson é jovem, rica, mimada e prestes a casar. Aproveita os últimos dias de celibato para a sua despedida de uma vida de borga.
O combóio vai levá-la de volta a Inglaterra. A caminho conhece a simpática Miss Frioy, uma preceptora.
Mas Miss Froy desaparece, Iris não a encontra e todos negam a sua existência.
É uma conspiração ou Iris sonhou tudo?
Um cocktail de acção, aventura, intriga, suspense e comédia, como só Hitchcock sabe.
Mas não se pense que isto é apenas entrenimento e peripécias.
Hitchcock pega em todo o seu savoir faire cinematográfico e faz um verdadeiro luxo de entretenimento, para os olhos e o cérebro, sempre atento ao pormenor, características, rigor narrativo e técnicas cinematográficas.
Sabe-se o quanto Hitchcock gosta de comboios (“Number Seventeen”, “The 39 Steps”, “Strangers on a Train”, “North by Northwest”) e este filme é mais uma prova, com dois terços da narrativa a passarem-se em carruagens.
O comboio é cenário e espaço, mas quase um personagem que cerca os personagens.
Depois há todo aquele rigor de Hitchcock, seja do ponto de vista técnico (as opções visuais), como narrativo (os personagens e os seus tiques e comportamentos)
Desde os movimentos de câmara (o plano inicial) ao recurso aos miniature effects (o que se passa nesse plano inicial), até ao uso do mudo (de onde Hitchcock é oriundo) que mostram o quanto ele sabe ilustrar situações só com recurso à imagem (a cena inicial).
Depois há a ironia (a forma como Hitchcock mostra a vida hoteleira e policial de um país de Leste), a ambiguidade sexual (o par de ingleses fanáticos de cricket), a “imoralidade” (o casal adúltero), a malícia (o vizinho a invadir o quarto da menina), o humor inesperado (a dança e música folclórica do vizinho de cima, a interrupção da explicação “açucarada” sobre cricket), o mistério (a serenata e o assassinato, a tentativa de agressão com o vaso), a atenção ao detalhe (o nome no vidro, o pacote de chá, os tacões), a caracterização visual (a forma como Hitchcock induz o espectador sobre cada personagem), a agonia (a luta lenta na “carruagem da magia”), a acção (a confrontação, cerco e perseguição final), o absurdo (a intriga parece não fazer sentido), o efeito MacGuffin (a mensagem em código) e, claro, o suspense (quem é quem, porque todos mentem, Miss Froy existe ou não, Iris diz a verdade ou é uma alucinação dela, as sucessivas reviravoltas sobre as (des)aparições de Miss Froy e as afirmações das testemunhas).
Todo um desfile da mestria de um génio dentro do género e da linguagem cinematográfica.
E com tal, “The Lady Vanishes” é uma verdadeira lição de como fazer Cinema, sem medo de ser entretido, popular, mas inteligente, cuidado e artístico.
Como sempre em Hitchcock, actores em estado de graça. A dupla Naunton Wayne e Basil Radford é verdadeiramente desconcertante. Dame May Whitty é encantadora. Paul Lukas consegue ser simpático e maléfico. Michael Redgrave é um prodígio de ironia. Margaret Lockwood cativa e fascina.
Subtilmente, o filme foca a possibilidade de uma nova guerra na Europa.
(não se engana muito, pois ela começaria no ano seguinte)
O filme cativa pelo ritmo cuidado, tenso e nunca precipitado. Envolve pelos eventos. Diverte-nos pela variedade carismática de tantos personagens.
Uma verdadeira maravilha de Cinema, no género e na obra de Hitchcock.
Provavelmente, o seu melhor filme do período britânico.
“The Lady Vanishes” tem edição portuguesa e a preço que apela a “desaparecer” para a prateleira do cinéfilo. A nossa edição e muitas das europeias têm os seus extras verdadeiramente vanished. Recomendo a edição da Criterion Collection, mas o preço é muito “aparecido”. Na Inglaterra saiu recentemente uma Special Edition (em DVD e Blu-Ray), com bons conteúdos, mas o preço ainda está alto.
Realizador: Alfred Hitchcock
Argumentistas: Sidney Gilliat, Frank Launder, a partir do livro de Ethel Lina White (“The Wheel Spins”)
Elenco: Margaret Lockwood, Michael Redgrave, Paul Lukas, Dame May Whitty, Cecil Parker, Linden Travers, Naunton Wayne, Basil Radford, Mary Clare, Catherine Lacey, Philip Leaver
Trailer
Filme
“Melhor Realizador”, pelos Críticos de Nova Iorque 1939.
Inicialmente intitulado “The Lost Lady”, seria realizado por Roy William Neill e com filmagens na Jugoslávia. Quando as autoridades locais descobriram que o filme não dava uma boa imagem delas, expulsaram a equipa. Hitchcock é chamado e faz alterações no argumento (nomeadamente o início e final).
Lilli Palmer foi considerada por Hitchcock para ser protagonista.
Vivien Leigh chegou a fazer testes para ser protagonista.
É o primeiro filme de Michael Redgrave. Redgrave era uma rising star no Teatro e estava algo relutante em aceitar passar para o Cinema, mas foi convencido por John Gielgud (outra grande figura do Teatro, com curriculum em Cinema, que já tinha trabalhado com Hitchcock – “Secret Agent”). Redgrave e Hitchcock não se deram bem – o actor queria ensaiar muito e o cineasta preferia a improvisação e a espontaneidade.
É o primeiro filme de Catherine Lacey.
Margaret Lockwood era grande fã dos contos e heroínas da escritora Ethel Lina White.
O filme tem algumas diferenças face ao livro. Neste, Miss Froy é raptada pois pensa-se que ela sabe algo (embora ela ache que nada sabe) sobre as autoridades locais (a cidade onde se inicia a acção); Iris sente-se mal devido a longa exposição solar; o combóio nunca pára; não há tiroteio final; a dupla Charters & Caldicott não tem equivalente no livro, pois foram criados prepositadamente para o filme.
Hitchcock disse a Peter Bogdanovich que a ideia do filme se baseia numa lenda sobre uma senhora inglesa que viaja com a filha até à Grande Exposição Mundial no Palace Hotel de Paris, no final de 1880s. A senhora adoece, a filha percorre Paris em busca de um remédio. Quando regressa, não há mãe, ninguém a viu e até o quarto onde estavam foi modificado. No final, sabe-se que a senhora tinha peste bubónica, teve de ser retirada, tudo teve de ser limpo e não se podia dizer a verdade para evitar o pânico na cidade.
É um dos filmes preferidos de Orson Welles, que chegou a vê-lo cerca de 11 vezes.
François Truffaut chegou a afirmar que este era o seu filme preferido de todos os de Hitchcock, considerando que era o que melhor representava o trabalho do cineasta.
Cameo de Alfred Hitchcock – perto do final, na estação Victoria, é ele o homem de casaco preto e a fumar, que abana os ombros.
Foi um enorme sucesso nas bilheteiras, pondo fim a um ciclo de três flops consecutivos (“Secret Agent”, “Sabotage”, “Young and Innocent”).
Charters & Caldicott (Basil Radford e Naunton Wayne) tornaram-se personagens tão populares, que chegaram a reaparecer noutros filmes.
Esta é a primeira aparição cinematográfica da dupla. Seriam vistos depois em “The Munich Express” (1940, de Carol Reed, já aqui visto), “Crook’s Tour” (1941, já aqui visto) e “Millions Like Us” (1943; já aqui visto). Com excepção de “Crook’s Tour”, todos foram escritos pela dupla Sidney Gilliat & Frank Launder.
O remake de 1979 de “The Lady Vanishes” manteria os personagens (interpretados por Arthur Lowe e Ian Carmichael).
Em 1985, os dois personagens reaparecem numa série da BBC, chamada “Charters & Caldicott” – Robin Bailey e Michael Aldridge eram os protagonistas.
Sobre a dupla Charters & Caldicott:
http://www.chartersandcaldicott.co.uk/
http://oldmovieteams.org/about/naunton-wayne-basil-radford/
http://www.patheos.com/blogs/slacktivist/2012/01/15/the-further-adventurs-of-charters-caldicott/
[…] aqui falei (e muito bem) de um e do […]
[…] & Naunton Wayne). Tinham sido vistos em “The Lady Vanishes” (1938, de Alfred Hitchcock, já aqui visto), “The Munich Express” (1940, de Carol Reed, já aqui visto) e “Crook’s Tour” […]
[…] & Naunton Wayne). Tinham sido vistos em “The Lady Vanishes” (1938, de Alfred Hitchcock, já aqui visto); voltariam em “Crook’s Tour” (1941, já aqui visto) e “Millions Like Us” […]