Paul Walker despediu-se de nós, há dias, de uma forma veloz e furiosa.
(não seria possível à Morte ser mais sarcástica, de facto)
A sua carreira fica marcada pela saga “Fast & Furious” (Walker ainda estava nas filmagens do Episódio 7).
Em jeito de (pequena) homenagem, e havendo um filme pelo qual ser lembrado, evoco este fantástico “Running Scared”.
É o melhor filme da filmografia de Walker.
É a sua melhor interpretação.
Joey Gazelle é um cleaning man deum importante mafioso. A sua mais recente missão é livrar-se de uma incómoda arma que serviu para matar alguns polícias (ainda que corruptos). Parece ser uma coisa banal. Mas tudo se complica quando a arma lhe sai das mãos. Vai ser uma longa e infernal noite à procura de tão disputado objecto. É que à medida que Gazelle se aproxima da arma, esta está sempre a mudar de “dono” e muitos são os (mortais) rastos deixados por ela. Acrescido que cada novo dono não parece interessado em livrar-se da dita arma.
Há várias razões para se elogiar este “Running Scared”.
Em primeiro lugar, o argumento. Não por ser uma coisa estonteante para o cérebro ou por explicar o sentido da Vida ou do Cosmos. Mas sim pelo ritmo avassalador de acontecimentos e a forma como todos se ligam. Vários são os personagens que surgem e há relevância em muitos deles. E é notável como se consegue fazer de uma arma uma personagem tão “estática” e manipuladora de tantos interesses e personagens.
Depois há a realização. Plena de ritmo e imparável dinâmica, mas que nunca cai no banal da estética de videoclip ou de videogo, fazendo-nos mesmo sentir o que é adrenalina. Wayne Kramer puxa de muitas das suas preferências e da sua cinefilia e dá ao filme uns toques estéticos de Sam Peckinpah, Walter Hill e do underground action cinema dos 70`s e 80`s. Pelo meio, Kramer ainda consegue criar uma sequência verdadeiramente perturbante (veja-se a forma como se distorce os fairy tales e os happy kingdoms) onde mistura o bizarro, o encantado e o terror (a “estadia” na casa do demente casal pedófilo), onde deve ser (altamente) elogiado os trabalhos (magníficos) de fotografia e cenografia.
Mas Kramer também sabe meter prego a fundo nas cenas de acção (atenção ao tiroteio inicial, impecavelmente coreografado e editado) e na violência (brutal, sem concessões e na linha do melhor que Walter Hill fazia).
No meio de tanta acção, há tempo para se focar a união familiar, a redenção perante a violência, os conflitos éticos e morais, a pedofilia, a violência familiar, a paternidade, a amizade e a lealdade.
Para além de Walker, o filme faz-se valer por um óptimo elenco composto pelo inquietante Cameron Bright (o menino que persegue Nicole Kidman em “Birth”), a esplêndida Vera Farmiga (que concilia a sua sensualidade como mulher e a determinação como mãe) e o impecável Chazz Palminteri (que é sempre um “manual” de como interpretar um vilão).
Atenção ao genérico final, de uma enorme criatividade visual e que resume os eventos do filme, com recurso a desenhos dignos de um twisted fairy tale.
“Running Scared” tem edição portuguesa e já anda pelas prateleiras das lojas a preço simpático desde há um par de anos.
Trailer
O filme
(com legendas em espanhol)
Com disse, é o melhor trabalho de Paul Walker. Consegue-nos traduzir todo o frenesim que sente pela situação em que está metido, os seus medos perante as consequências do falhanço da sua missão, bem como as suas responsabilidades familiares. Sai-se bem como action hero (ainda que involuntário) e até convence como pai e marido.
Talvez não se possa considerar Paul Walker como um grande ou excelente actor. Mas o que fazia, fazia com simplicidade, naturalidade e à vontade como se estivesse no seu dia-a-dia real. A Vida roubou-o cedo (demais) e nunca teremos oportunidade de ver o que nos poderia dar quando empenhado e bem dirigido (como aconteceu aqui, neste “Running Scared”).
Vamos voltar a vê-lo em 2014. Para além de “Fast & Furious 7” (no Verão), vamos vê-lo já em Janeiro, com “Hours”, onde o voltaremos a ver num registo mais real e humano, como um pai que procura salvar a sua filha durante passagem do furacão Katrina.
Descansa em paz, Paul.
Fica a carreira, ficam os filmes. Para se (re)verem e (re)avaliarem.
Sem velocidade e sem fúria.
Thomas Jane ia ser o protagonista de “Running Scared”, mas teve de recusar devido a conflitos de agenda. Paul Walker foi a segunda escolha.
(curiosamente, Jane esteve convocado para um outro filme a ser realizador por Kramer – “Bullet to the Head” -, mas também saiu de cena, ainda que involuntariamente, na consequência de ter sugerido outro realizador devido a conflitos criativos entre Kramer e o protagonista Sylvester Stallone; Kramer seria substituído por Walter Hill, Jane seria substituído por Sung Kang, um dos actores da saga “Fast & Furious”, onde brilhou… Paul Walker)